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1- Resumir com suas PALAVRAS os textos.
2 - Aplicar um principio biblico PARA CADA CAPÍTULO.
3 - Escrever quais as liçoes de cada capitulo voce pode aplicar em sua vida.
4 - Fazer uma analise critica dos capitulos. (dê sua opinião)
terça-feira, 6 de julho de 2010
domingo, 4 de julho de 2010
Parte B - Capitulo 3 - Bons alunos escondem certas intenções, alunos fascinantes são transparentes.
PARTE B
Capítulo 3
Bons alunos escondem certas
intenções, alunos fascinantes
são transparentes.
A memorável história de uma rainha
Sofia era uma professora de filosofia muito preocupada com o caráter dos seus alunos. Gostava de ler jornais, mas volta e meia estourava um escândalo na imprensa envolvendo corrupção de políticos, vantagens em licitações, fraudes, tráfico de influência. Sabia que havia líderes sérios e comprometidos com a sociedade, mas tinha consciência de que somente uma safra de jovens transparentes, amantes da honestidade e fiéis à sua consciência poderia mudar os pilares da sociedade.
Certa vez, mais um escândalo estourou na imprensa envolvendo o presidente do país e seus principais assessores. Ela ficou preocupada com as conseqüências desse escândalo no inconsciente coletivo da juventude. Poderia desanimá-los a se tornarem líderes sociais, a não terem esperança na sua nação e poderia até bloquear seus sonhos.
No outro dia, perguntou o que os alunos pensavam dos políticos. A visão pessimista dos jovens a assustou. Uns responderam que era a melhor maneira de ganhar dinheiro, outro disse que raramente algum presta e ainda outros diziam que todos eram
farinha do mesmo saco. Alguns ainda disseram que, quando crescessem, queriam ser políticos, para levar vantagem em tudo.
Preocupadíssima, ela disse que corrupção havia em todos os países, o que diferia era a freqüência e intensidade do procedimento.
— Uma pessoa corrupta — disse ela — é egocêntrica, individualista, não tem tranqüilidade, possui uma dívida impagável com sua própria consciência. Uma pessoa corrupta nunca será um grande líder social, pois não é líder de si mesma.
Querendo treinar o caráter dos seus alunos, ela contou-lhes uma fascinante história que mudaria para sempre a visão de muitos deles.
Há muitos anos um poderoso e inteligente príncipe queria encontrar a mulher da sua vida. Seu pai estava doente e ele estava para se tornar rei. Porém, não queria errar na escolha, afinal de contas a jovem com quem se casaria se tornaria a rainha. Sonhava que quem reinasse com ele fosse gentil, dócil, amável e principalmente transparente.
O maior medo do futuro rei era de que a mulher com quem se casasse valorizasse mais seu reino do que ele mesmo, mais os privilégios da corte e seus tesouros do que o seu amor. Os ministros do reino consideravam a preocupação do príncipe imatura. Alguns o achavam frágil e pouco inteligente, indigno da coroa.
Consultou os sábios para saber como não errar nessa decisão tão importante. Os sábios disseram que ele deveria casar-se com uma jovem riquíssima do próprio reino ou, melhor ainda, deveria desposar a filha de um poderoso rei de outra nação. Assim, alargaria suas fronteiras.
O reino estava envolvido em disputas internas malévolas. Devido à doença do rei, alguns ministros, generais, coletores de impostos aproveitaram a situação para se corromper, disse a professora de filosofia. Em seguida, adicionou:
— A falta de liderança é um canteiro para o individualismo. Escolher a futura rainha era importante para manter a unidade do reino. Muitos achavam que se o príncipe não mostrasse inteligência para encontrar sua esposa, não teria inteligência para governar seu reino.
Encontrando a resposta na natureza
Desanimado com os conselhos que lhe deram, o príncipe saiu pelos campos a pensar. Depois de horas de meditação, caiu-lhe algo na cabeça. Levou as mãos para ver
o que era e ficou fascinado, era uma semente amarela e pequena. De repente, veio-lhe a euforia, pois encontrara sua resposta. Parecia embriagado de alegria.
Resolveu promover uma festa para que as moças interessadas em casar-se com ele pudessem apresentar-se. Foram convidadas jovens de vários outros reinos, bem como as do seu território, especialmente as mais ricas.
Trabalhava no castelo, como serva, uma senhora que tinha uma linda e singela filha, chamada Priscila. Quando comunicou a Priscila que o príncipe iria casar-se e que ele daria uma grande festa para escolher a noiva, ela disse que se apresentaria como candidata. Priscila o admirava sem o conhecer pessoalmente, pois sua mãe sempre contava sobre a bondade, simplicidade e inteligência do jovem herdeiro.
Uma mulher rica do reino, cuja filha participaria do concurso, ficou sabendo da intenção de Priscila. Chamou-lhe a mãe e, com arrogância, disse-lhe:
— Sua filha está delirando, sonhando com o impossível! A filha de uma serva jamais poderá ser uma rainha. É contra os princípios.
Profundamente entristecida, mas achando que essa mulher estava correta, a mãe de Priscila comentou as frases cortantes que ouvira. A jovem, abalada, rebateu:
— Mamãe, nós somos pobres, mas somos seres humanos! O dinheiro compra carruagens, mas não compra a felicidade, compra roupas tecidas com fios de ouro, mas não compra o valor de uma pessoa — falou a jovem com dignidade.
Apesar de ser pobre, Priscila queria ser tratada com dignidade. Sabia que não tinha chance nenhuma de ser a escolhida, mas queria aproveitar a oportunidade para ficar perto do príncipe. Amava um desafio. Ela possuía uma beleza interior que contagiava as pessoas. Muitas jovens ricas gostavam de ficar perto dela.
— Priscila tinha três jóias que valiam mais que diamantes: simplicidade, generosidade e transparência — disse Sofia. E perguntou para toda a classe: — Quais dessas jóias vocês possuem?
Os alunos ficaram pensativos. Em seguida, a professora continuou contando sua história. Disse que algumas jovens filhas de lordes eram boas alunas, conseguiam notas altas nas provas, mas simulavam seus comportamentos. Ninguém sabia o que elas realmente pensavam ou sentiam. Gostavam de se exaltar e contar vantagens, em busca das migalhas dos aplausos. Algumas mentiam até para si mesmas.
Entre essas jovens estavam Helena e Barbie. Elas conheciam Priscila e tinham inveja dela, não admitiam que a filha de um camponês com uma empregada do palácio
fosse tão sociável e cativante. Duas semanas antes do concurso, elas a encontraram e a estimularam a participar dele. Pareciam estar sendo generosas.
Na realidade, estavam simulando sua verdadeira intenção. Queriam que Priscila fosse zombada publicamente, pois achavam que somente alguém perturbada poderia ter a coragem de concorrer ao lado delas e de outras belas moças, com os mais belos vestidos e com as mais belas jóias do reino.
Um desafio aparentemente simples
O grande dia chegou. Centenas de jovens finamente trajadas estavam no saguão do grande palácio. Ao ver Priscila e observar seu vestido de cima a baixo, algumas jovens não contiveram seu sorriso de deboche. Aparentemente seu vestido era o mais simples e o mais feio. Helena e Barbie se aproximaram uma da outra e disseram:
— Coitada! Descobriram a boba da corte.
Priscila ouviu que estavam zombando dela e entendeu afinal qual era a verdadeira intenção delas.
De repente, ao som de trombetas, o príncipe apareceu com seus ministros, generais e sábios do reino. Todas as jovens suspiraram. Ninguém sabia o que as aguardava. Nem os que rodeavam o príncipe sabiam como se daria o processo de escolha. Um momento solene de silêncio se fez. Subitamente o príncipe abriu a boca e aos brados lançou um desafio:
— Cada uma de vocês receberá uma semente para ser cultivada. Daqui a três meses darei um grande baile. Aquela que me trouxer a mais linda flor será a escolhida para ser a rainha — disse o príncipe com singeleza e espontaneidade.
Todas as moças acharam estranho o desafio do príncipe. Era muito simples a tarefa. Animadas, a maioria saiu do palácio convicta de que receberia a coroa. Os sábios e os ministros do reino menearam a cabeça achando que realmente o jovem era despreparado para governar. Jamais viram um príncipe tão ingênuo e destituído de inteligência. Um cargo tão grande merecia um desafio à altura, pensaram.
Várias pretendentes, julgando-se espertas, entenderam que o príncipe pretendia na verdade era que o estilo dos cabelos, das vestes e dos movimentos do corpo fossem tão belos como uma flor.
O drama de Priscila
Priscila pegou a sua semente, plantou-a num vaso e, apesar de pouco entender de jardinagem, cuidava da terra com muita paciência e ternura. Sonhava com a planta que nasceria e com a belíssima flor que dela surgiria. Às vezes, libertava sua imaginação e sentia até seu perfume.
Passou-se uma semana e a planta não nasceu. Priscila ficou preocupada. Regava mais ainda, deixava cair a cada hora algumas delicadas gotas de água. Duas semanas se passaram e o broto não surgiu. A moça esmerou-se ainda mais nos seus cuidados. Aconselhou-se com pessoas experientes.
Alguns jardineiros disseram que a semente não nasceu porque ela colocou muita água, outros, adubo em excesso, e ainda outros porque compactou demais a terra do vaso. Todos foram unânimes em dizer que, independente da causa, se a semente não eclodiu em quinze dias dificilmente nasceria. Desesperada, via seu sonho cada vez mais distante. Apesar da frustração, não conseguia dissipar seu amor pelo príncipe.
Um mês se passou e o vaso continuava sem vida. Enquanto derramava as gotas de água, as gotas de lágrimas também caíam no recipiente. Dois meses se passaram e seu coração estava partido. A flor não brotou e seu coração se entristeceu.
Sofia fitou os olhos dos seus alunos e disse-lhes:
— Algumas pessoas aconselharam que ela plantasse outras sementes. Afinal de contas, ninguém descobriria. O que vocês fariam? Plantariam outras sementes? Vale a pena obter o sucesso a qualquer preço?
Alguns na classe acharam que não havia mal algum em plantar outra semente. Segundo eles, os fins justificam os meios. Mas Priscila rejeitou essa idéia.
Três meses se passaram e o pequeno vaso continuava estéril, sem vida. Vendo-a abatida, as pessoas próximas aconselharam que ela jamais retornasse ao concurso. Todos sabiam que Priscila era gentil, mas, ao mesmo tempo, determinada e teimosa. Depois de muito meditar e de estar consciente de que fez de tudo ao seu alcance, disse, para espanto de todos, que iria ao baile e levaria seu vaso, mesmo sem planta.
— É loucura! — diziam os amigos.
— Será um vexame! — diziam os parentes.
Sua mãe fez um último esforço para ela não retornar ao palácio. Vendo a dor da mãe, Priscila derramou novamente algumas lágrimas que borraram a sua maquiagem e molharam seu vestido simples. Para consolar a mãe, disse-lhe:
— Poderei passar vergonha mais uma vez, mamãe, mas serei honesta comigo mesma. Não consegui cultivar a semente e vou assumir meu erro.
Quando chegou ao baile, perturbou-se muitíssimo. Viu todas as outras pretendentes segurando vasos com as mais lindas flores, uma mais linda do que a outra. Os vestidos combinavam com as cores das pétalas. Era algo sublime.
Ao ver Priscila, mais uma vez, várias pretendentes debocharam dela. Dessa vez o deboche foi mais aparente. Deram gargalhadas incontroladas, não apenas porque não possuía jóias e seu vestido era simples e fora de moda, mas porque seu vaso não tinha flor, não possuía vida. Humilhada, começou a entrar em pânico e pensou em desistir.
De repente, as cometas tocaram triunfalmente. Todas ficaram em profundo silêncio. Quando o príncipe chegou, elas suspiraram. Ele pediu para que elas formassem filas. Elas, eufóricas, enfileiraram-se. O príncipe se aproximou de cada uma delas. Olhava para seus olhos e para a formosura da flor. Em seguida, perguntava seus nomes.
Quando chegou diante de Priscila e viu o vaso sem flor e seu vestido com gotas de lágrimas, meneou a cabeça e nem sequer seu nome perguntou. As moças que estavam próximas colocaram seus lenços na boca para que não se ouvisse o som das suas risadas.
Os líderes do reino observavam atentamente os gestos do príncipe e se entreolhavam. Depois de três horas, e de analisar flor por flor, o príncipe sentou-se no seu trono. Em seguida, pediu que as moças fizessem uma grande roda no salão nobre do palácio. Disse que sua decisão tinha sido tomada e que a jovem que ele tirasse para dançar seria a escolhida.
Além das moças e dos líderes do reino, havia reis e nobres na lateral do salão torcendo por suas filhas. Chegou o grande momento.
As pessoas transparentes fazem a diferença
A professora de filosofia, mais uma vez, dirigiu-se aos seus alunos e perguntou:
— Quem o príncipe escolheria? Que parâmetro usaria para encontrar sua rainha?
Os alunos ficaram perdidos. Não tinham respostas. Estavam ansiosos para saber qual era a decisão. Sofia continuou. O príncipe foi para o meio do salão. Passou seus olhos sobre a roda de mulheres e, para surpresa de todos, foi até a jovem que não tinha flor nenhuma no vaso, beijou suas mãos e, emocionado, disse-lhe:
— Qual seu nome?
Com os lábios trêmulos, ela lhe disse:
— Priscila.
— Minha rainha! Priscila, você aceita dançar comigo e ser minha esposa? — falou com suavidade.
Priscila caiu em prantos. Todos estavam perplexos. O burburinho foi geral. Ninguém entendeu sua atitude. Os ministros e sábios achavam que o príncipe estava delirando. Os generais pensaram que ele estava brincando.
Então, calmamente, explicou em voz alta:
— Para se tornar uma rainha, é preciso cultivar uma flor muito especial: a flor da transparência, da cumplicidade, da honestidade diante de si mesma. Sem tal característica não é possível amar, governar, liderar, ser fraterno e justo. Todas as sementes que entreguei a vocês eram estéreis e delas não poderia nascer uma flor. Portanto, a única pessoa que foi transparente, enfrentou sua vergonha, frustração, deboche e provou seu amor incondicional por mim foi a Priscila.
Em seguida, num momento de rara inspiração, ele completou:
— Seu vaso não precisa de flor, pois ela representa a flor que não nasceu.
Os sábios do reino ficaram boquiabertos, jamais viram tanta sabedoria. Os ministros, rígidos e interesseiros, ficaram assombrados com a inteligência de seu rei. Entenderam que estavam diante de um dos homens mais sublimes que já conheceram. Os demais presentes, inclusive a maioria das outras pretendentes caíram em aplauso. Aplaudiram a inteligência do rei e a sensibilidade e transparência da rainha.
Priscila foi generosa com quem a maltratou, foi delicada com quem a perseguiu. Foi digna da coroa que carregava em sua cabeça, porque já havia um tesouro em sua personalidade. Sabia que uma rainha não era mais importante do que um súdito, pois conhecia a dignidade de cada ser humano.
Vários alunos na classe também estavam emocionados. Nesse clima de comoção, a professora Sofia lhes disse:
— Nunca se esqueçam de que se vocês quiserem brilhar como alunos, como filhos e, no futuro, como excelentes profissionais e como líderes sociais, precisam cultivar todos os dias a flor da transparência.
A professora pegou um giz, dirigiu-se ao quadro-negro e escreveu:
Bons alunos escondem certas intenções, mas alunos fascinantes são transparentes. Eles sabem que quem não é fiel à sua consciência tem uma dívida impagável consigo mesmo. Não querem, como alguns políticos, o sucesso a qualquer preço. Só querem o sucesso conquistado com suor, inteligência e transparência. Pois sabem que é melhor a verdade que dói do que a mentira que produz falso alívio.
E completou dizendo que, quem desenvolver o hábito da transparência, será um excelente debatedor de idéias, superará a timidez, refinará a sabedoria, influenciará pessoas, brilhará profissionalmente e mudará os rumos da sociedade. Ainda se alguns tentarem enterrar suas idéias, não se esqueçam de que as idéias são sementes e o maior favor que se faz a uma semente é enterrá-la.
Em seguida, num golpe de reflexão, a professora acrescentou que muitos políticos, empresários, líderes de instituições estão despreparados para assumir o poder. Quando assumem o poder se transformam, se tornam orgulhosos, inatingíveis, inacessíveis e, diferente de Priscila, negam as suas raízes, esquecem de onde vieram.
— Quem ama o poder e não o poder de amar não é digno de ser um líder — finalizou.
Os alunos ficaram assombrados com essas palavras. Alguns saíram atônitos da escola. Alguns prometeram para si mesmos que com respeito e gentileza jamais se calariam, seriam debatedores de idéias durante toda a sua vida.
Os anos se passaram e do pequeno grupo saíram alguns grandes líderes sociais, pessoas que lutaram contra injustiças, batalharam contra todo tipo de discriminação, influenciaram pessoas e mudaram os rumos da sociedade.
Capítulo 3
Bons alunos escondem certas
intenções, alunos fascinantes
são transparentes.
A memorável história de uma rainha
Sofia era uma professora de filosofia muito preocupada com o caráter dos seus alunos. Gostava de ler jornais, mas volta e meia estourava um escândalo na imprensa envolvendo corrupção de políticos, vantagens em licitações, fraudes, tráfico de influência. Sabia que havia líderes sérios e comprometidos com a sociedade, mas tinha consciência de que somente uma safra de jovens transparentes, amantes da honestidade e fiéis à sua consciência poderia mudar os pilares da sociedade.
Certa vez, mais um escândalo estourou na imprensa envolvendo o presidente do país e seus principais assessores. Ela ficou preocupada com as conseqüências desse escândalo no inconsciente coletivo da juventude. Poderia desanimá-los a se tornarem líderes sociais, a não terem esperança na sua nação e poderia até bloquear seus sonhos.
No outro dia, perguntou o que os alunos pensavam dos políticos. A visão pessimista dos jovens a assustou. Uns responderam que era a melhor maneira de ganhar dinheiro, outro disse que raramente algum presta e ainda outros diziam que todos eram
farinha do mesmo saco. Alguns ainda disseram que, quando crescessem, queriam ser políticos, para levar vantagem em tudo.
Preocupadíssima, ela disse que corrupção havia em todos os países, o que diferia era a freqüência e intensidade do procedimento.
— Uma pessoa corrupta — disse ela — é egocêntrica, individualista, não tem tranqüilidade, possui uma dívida impagável com sua própria consciência. Uma pessoa corrupta nunca será um grande líder social, pois não é líder de si mesma.
Querendo treinar o caráter dos seus alunos, ela contou-lhes uma fascinante história que mudaria para sempre a visão de muitos deles.
Há muitos anos um poderoso e inteligente príncipe queria encontrar a mulher da sua vida. Seu pai estava doente e ele estava para se tornar rei. Porém, não queria errar na escolha, afinal de contas a jovem com quem se casaria se tornaria a rainha. Sonhava que quem reinasse com ele fosse gentil, dócil, amável e principalmente transparente.
O maior medo do futuro rei era de que a mulher com quem se casasse valorizasse mais seu reino do que ele mesmo, mais os privilégios da corte e seus tesouros do que o seu amor. Os ministros do reino consideravam a preocupação do príncipe imatura. Alguns o achavam frágil e pouco inteligente, indigno da coroa.
Consultou os sábios para saber como não errar nessa decisão tão importante. Os sábios disseram que ele deveria casar-se com uma jovem riquíssima do próprio reino ou, melhor ainda, deveria desposar a filha de um poderoso rei de outra nação. Assim, alargaria suas fronteiras.
O reino estava envolvido em disputas internas malévolas. Devido à doença do rei, alguns ministros, generais, coletores de impostos aproveitaram a situação para se corromper, disse a professora de filosofia. Em seguida, adicionou:
— A falta de liderança é um canteiro para o individualismo. Escolher a futura rainha era importante para manter a unidade do reino. Muitos achavam que se o príncipe não mostrasse inteligência para encontrar sua esposa, não teria inteligência para governar seu reino.
Encontrando a resposta na natureza
Desanimado com os conselhos que lhe deram, o príncipe saiu pelos campos a pensar. Depois de horas de meditação, caiu-lhe algo na cabeça. Levou as mãos para ver
o que era e ficou fascinado, era uma semente amarela e pequena. De repente, veio-lhe a euforia, pois encontrara sua resposta. Parecia embriagado de alegria.
Resolveu promover uma festa para que as moças interessadas em casar-se com ele pudessem apresentar-se. Foram convidadas jovens de vários outros reinos, bem como as do seu território, especialmente as mais ricas.
Trabalhava no castelo, como serva, uma senhora que tinha uma linda e singela filha, chamada Priscila. Quando comunicou a Priscila que o príncipe iria casar-se e que ele daria uma grande festa para escolher a noiva, ela disse que se apresentaria como candidata. Priscila o admirava sem o conhecer pessoalmente, pois sua mãe sempre contava sobre a bondade, simplicidade e inteligência do jovem herdeiro.
Uma mulher rica do reino, cuja filha participaria do concurso, ficou sabendo da intenção de Priscila. Chamou-lhe a mãe e, com arrogância, disse-lhe:
— Sua filha está delirando, sonhando com o impossível! A filha de uma serva jamais poderá ser uma rainha. É contra os princípios.
Profundamente entristecida, mas achando que essa mulher estava correta, a mãe de Priscila comentou as frases cortantes que ouvira. A jovem, abalada, rebateu:
— Mamãe, nós somos pobres, mas somos seres humanos! O dinheiro compra carruagens, mas não compra a felicidade, compra roupas tecidas com fios de ouro, mas não compra o valor de uma pessoa — falou a jovem com dignidade.
Apesar de ser pobre, Priscila queria ser tratada com dignidade. Sabia que não tinha chance nenhuma de ser a escolhida, mas queria aproveitar a oportunidade para ficar perto do príncipe. Amava um desafio. Ela possuía uma beleza interior que contagiava as pessoas. Muitas jovens ricas gostavam de ficar perto dela.
— Priscila tinha três jóias que valiam mais que diamantes: simplicidade, generosidade e transparência — disse Sofia. E perguntou para toda a classe: — Quais dessas jóias vocês possuem?
Os alunos ficaram pensativos. Em seguida, a professora continuou contando sua história. Disse que algumas jovens filhas de lordes eram boas alunas, conseguiam notas altas nas provas, mas simulavam seus comportamentos. Ninguém sabia o que elas realmente pensavam ou sentiam. Gostavam de se exaltar e contar vantagens, em busca das migalhas dos aplausos. Algumas mentiam até para si mesmas.
Entre essas jovens estavam Helena e Barbie. Elas conheciam Priscila e tinham inveja dela, não admitiam que a filha de um camponês com uma empregada do palácio
fosse tão sociável e cativante. Duas semanas antes do concurso, elas a encontraram e a estimularam a participar dele. Pareciam estar sendo generosas.
Na realidade, estavam simulando sua verdadeira intenção. Queriam que Priscila fosse zombada publicamente, pois achavam que somente alguém perturbada poderia ter a coragem de concorrer ao lado delas e de outras belas moças, com os mais belos vestidos e com as mais belas jóias do reino.
Um desafio aparentemente simples
O grande dia chegou. Centenas de jovens finamente trajadas estavam no saguão do grande palácio. Ao ver Priscila e observar seu vestido de cima a baixo, algumas jovens não contiveram seu sorriso de deboche. Aparentemente seu vestido era o mais simples e o mais feio. Helena e Barbie se aproximaram uma da outra e disseram:
— Coitada! Descobriram a boba da corte.
Priscila ouviu que estavam zombando dela e entendeu afinal qual era a verdadeira intenção delas.
De repente, ao som de trombetas, o príncipe apareceu com seus ministros, generais e sábios do reino. Todas as jovens suspiraram. Ninguém sabia o que as aguardava. Nem os que rodeavam o príncipe sabiam como se daria o processo de escolha. Um momento solene de silêncio se fez. Subitamente o príncipe abriu a boca e aos brados lançou um desafio:
— Cada uma de vocês receberá uma semente para ser cultivada. Daqui a três meses darei um grande baile. Aquela que me trouxer a mais linda flor será a escolhida para ser a rainha — disse o príncipe com singeleza e espontaneidade.
Todas as moças acharam estranho o desafio do príncipe. Era muito simples a tarefa. Animadas, a maioria saiu do palácio convicta de que receberia a coroa. Os sábios e os ministros do reino menearam a cabeça achando que realmente o jovem era despreparado para governar. Jamais viram um príncipe tão ingênuo e destituído de inteligência. Um cargo tão grande merecia um desafio à altura, pensaram.
Várias pretendentes, julgando-se espertas, entenderam que o príncipe pretendia na verdade era que o estilo dos cabelos, das vestes e dos movimentos do corpo fossem tão belos como uma flor.
O drama de Priscila
Priscila pegou a sua semente, plantou-a num vaso e, apesar de pouco entender de jardinagem, cuidava da terra com muita paciência e ternura. Sonhava com a planta que nasceria e com a belíssima flor que dela surgiria. Às vezes, libertava sua imaginação e sentia até seu perfume.
Passou-se uma semana e a planta não nasceu. Priscila ficou preocupada. Regava mais ainda, deixava cair a cada hora algumas delicadas gotas de água. Duas semanas se passaram e o broto não surgiu. A moça esmerou-se ainda mais nos seus cuidados. Aconselhou-se com pessoas experientes.
Alguns jardineiros disseram que a semente não nasceu porque ela colocou muita água, outros, adubo em excesso, e ainda outros porque compactou demais a terra do vaso. Todos foram unânimes em dizer que, independente da causa, se a semente não eclodiu em quinze dias dificilmente nasceria. Desesperada, via seu sonho cada vez mais distante. Apesar da frustração, não conseguia dissipar seu amor pelo príncipe.
Um mês se passou e o vaso continuava sem vida. Enquanto derramava as gotas de água, as gotas de lágrimas também caíam no recipiente. Dois meses se passaram e seu coração estava partido. A flor não brotou e seu coração se entristeceu.
Sofia fitou os olhos dos seus alunos e disse-lhes:
— Algumas pessoas aconselharam que ela plantasse outras sementes. Afinal de contas, ninguém descobriria. O que vocês fariam? Plantariam outras sementes? Vale a pena obter o sucesso a qualquer preço?
Alguns na classe acharam que não havia mal algum em plantar outra semente. Segundo eles, os fins justificam os meios. Mas Priscila rejeitou essa idéia.
Três meses se passaram e o pequeno vaso continuava estéril, sem vida. Vendo-a abatida, as pessoas próximas aconselharam que ela jamais retornasse ao concurso. Todos sabiam que Priscila era gentil, mas, ao mesmo tempo, determinada e teimosa. Depois de muito meditar e de estar consciente de que fez de tudo ao seu alcance, disse, para espanto de todos, que iria ao baile e levaria seu vaso, mesmo sem planta.
— É loucura! — diziam os amigos.
— Será um vexame! — diziam os parentes.
Sua mãe fez um último esforço para ela não retornar ao palácio. Vendo a dor da mãe, Priscila derramou novamente algumas lágrimas que borraram a sua maquiagem e molharam seu vestido simples. Para consolar a mãe, disse-lhe:
— Poderei passar vergonha mais uma vez, mamãe, mas serei honesta comigo mesma. Não consegui cultivar a semente e vou assumir meu erro.
Quando chegou ao baile, perturbou-se muitíssimo. Viu todas as outras pretendentes segurando vasos com as mais lindas flores, uma mais linda do que a outra. Os vestidos combinavam com as cores das pétalas. Era algo sublime.
Ao ver Priscila, mais uma vez, várias pretendentes debocharam dela. Dessa vez o deboche foi mais aparente. Deram gargalhadas incontroladas, não apenas porque não possuía jóias e seu vestido era simples e fora de moda, mas porque seu vaso não tinha flor, não possuía vida. Humilhada, começou a entrar em pânico e pensou em desistir.
De repente, as cometas tocaram triunfalmente. Todas ficaram em profundo silêncio. Quando o príncipe chegou, elas suspiraram. Ele pediu para que elas formassem filas. Elas, eufóricas, enfileiraram-se. O príncipe se aproximou de cada uma delas. Olhava para seus olhos e para a formosura da flor. Em seguida, perguntava seus nomes.
Quando chegou diante de Priscila e viu o vaso sem flor e seu vestido com gotas de lágrimas, meneou a cabeça e nem sequer seu nome perguntou. As moças que estavam próximas colocaram seus lenços na boca para que não se ouvisse o som das suas risadas.
Os líderes do reino observavam atentamente os gestos do príncipe e se entreolhavam. Depois de três horas, e de analisar flor por flor, o príncipe sentou-se no seu trono. Em seguida, pediu que as moças fizessem uma grande roda no salão nobre do palácio. Disse que sua decisão tinha sido tomada e que a jovem que ele tirasse para dançar seria a escolhida.
Além das moças e dos líderes do reino, havia reis e nobres na lateral do salão torcendo por suas filhas. Chegou o grande momento.
As pessoas transparentes fazem a diferença
A professora de filosofia, mais uma vez, dirigiu-se aos seus alunos e perguntou:
— Quem o príncipe escolheria? Que parâmetro usaria para encontrar sua rainha?
Os alunos ficaram perdidos. Não tinham respostas. Estavam ansiosos para saber qual era a decisão. Sofia continuou. O príncipe foi para o meio do salão. Passou seus olhos sobre a roda de mulheres e, para surpresa de todos, foi até a jovem que não tinha flor nenhuma no vaso, beijou suas mãos e, emocionado, disse-lhe:
— Qual seu nome?
Com os lábios trêmulos, ela lhe disse:
— Priscila.
— Minha rainha! Priscila, você aceita dançar comigo e ser minha esposa? — falou com suavidade.
Priscila caiu em prantos. Todos estavam perplexos. O burburinho foi geral. Ninguém entendeu sua atitude. Os ministros e sábios achavam que o príncipe estava delirando. Os generais pensaram que ele estava brincando.
Então, calmamente, explicou em voz alta:
— Para se tornar uma rainha, é preciso cultivar uma flor muito especial: a flor da transparência, da cumplicidade, da honestidade diante de si mesma. Sem tal característica não é possível amar, governar, liderar, ser fraterno e justo. Todas as sementes que entreguei a vocês eram estéreis e delas não poderia nascer uma flor. Portanto, a única pessoa que foi transparente, enfrentou sua vergonha, frustração, deboche e provou seu amor incondicional por mim foi a Priscila.
Em seguida, num momento de rara inspiração, ele completou:
— Seu vaso não precisa de flor, pois ela representa a flor que não nasceu.
Os sábios do reino ficaram boquiabertos, jamais viram tanta sabedoria. Os ministros, rígidos e interesseiros, ficaram assombrados com a inteligência de seu rei. Entenderam que estavam diante de um dos homens mais sublimes que já conheceram. Os demais presentes, inclusive a maioria das outras pretendentes caíram em aplauso. Aplaudiram a inteligência do rei e a sensibilidade e transparência da rainha.
Priscila foi generosa com quem a maltratou, foi delicada com quem a perseguiu. Foi digna da coroa que carregava em sua cabeça, porque já havia um tesouro em sua personalidade. Sabia que uma rainha não era mais importante do que um súdito, pois conhecia a dignidade de cada ser humano.
Vários alunos na classe também estavam emocionados. Nesse clima de comoção, a professora Sofia lhes disse:
— Nunca se esqueçam de que se vocês quiserem brilhar como alunos, como filhos e, no futuro, como excelentes profissionais e como líderes sociais, precisam cultivar todos os dias a flor da transparência.
A professora pegou um giz, dirigiu-se ao quadro-negro e escreveu:
Bons alunos escondem certas intenções, mas alunos fascinantes são transparentes. Eles sabem que quem não é fiel à sua consciência tem uma dívida impagável consigo mesmo. Não querem, como alguns políticos, o sucesso a qualquer preço. Só querem o sucesso conquistado com suor, inteligência e transparência. Pois sabem que é melhor a verdade que dói do que a mentira que produz falso alívio.
E completou dizendo que, quem desenvolver o hábito da transparência, será um excelente debatedor de idéias, superará a timidez, refinará a sabedoria, influenciará pessoas, brilhará profissionalmente e mudará os rumos da sociedade. Ainda se alguns tentarem enterrar suas idéias, não se esqueçam de que as idéias são sementes e o maior favor que se faz a uma semente é enterrá-la.
Em seguida, num golpe de reflexão, a professora acrescentou que muitos políticos, empresários, líderes de instituições estão despreparados para assumir o poder. Quando assumem o poder se transformam, se tornam orgulhosos, inatingíveis, inacessíveis e, diferente de Priscila, negam as suas raízes, esquecem de onde vieram.
— Quem ama o poder e não o poder de amar não é digno de ser um líder — finalizou.
Os alunos ficaram assombrados com essas palavras. Alguns saíram atônitos da escola. Alguns prometeram para si mesmos que com respeito e gentileza jamais se calariam, seriam debatedores de idéias durante toda a sua vida.
Os anos se passaram e do pequeno grupo saíram alguns grandes líderes sociais, pessoas que lutaram contra injustiças, batalharam contra todo tipo de discriminação, influenciaram pessoas e mudaram os rumos da sociedade.
PARTE B - Capítulo 2 Bons alunos são repetidores de informações, alunos fascinantes
PARTE B
Capítulo 2
Bons alunos são repetidores
de informações, alunos fascinantes
são pensadores
Uma mente agitada
O professor Júlio César era super engraçado e, ao mesmo tempo, tinha uma inteligência muito aguçada. No começo, rejeitava as idéias de Romanov, mas, à medida que se conheceram, tornaram-se amigos inseparáveis.
Romanov disse-lhe certa vez um pensamento inesquecível que ele anotou no espelho do seu banheiro:
Os professores não são valorizados socialmente como merecem, não estão nos noticiários da TV, vivem no anonimato da sala de aula, mas são os únicos que têm o poder de causar uma revolução social. Com uma das mãos eles escrevem na lousa, com a outra, movem o mundo, pois trabalham com a maior riqueza da sociedade: a juventude. Cada aluno é um diamante que, bem lapidado, brilhará para sempre.
O pensamento de Romanov renovou a paixão de Júlio César pela educação. Ele era professor de línguas havia mais de 15 anos, mas estava desanimado e perplexo nos
últimos tempos por observar o aumento gradual de ansiedade dos alunos. Percebia que a mente deles estava cada vez mais agitada e inquieta. As conversas paralelas e a agressividade haviam se expandido muitíssimo.
Júlio César, Romanov, Jéferson e outros professores procuraram uma explicação desse comportamento dos alunos, que se tornara um fenômeno mundial. Depois de exaustivas pesquisas descobriram finalmente uma hipótese da síndrome SPA, Síndrome do Pensamento Acelerado, que explicava que a edição dos eventos da vida nas sociedades modernas atuava no teatro da mente humana e modificava a velocidade de construção dos pensamentos e das emoções.
As pessoas estavam agitadíssimas. Tudo era muito rápido. As pessoas comiam, falavam e trabalhavam aceleradamente. Até os filmes atuais tinham uma velocidade muito maior das cenas do que os filmes do passado.
Entenderam que os alunos não tinham culpa por ser ansiosos. O culpado era o sistema social que expandiu o número de necessidades, nem sempre necessárias, e o número de informações como nunca ocorreu na história, entulhando a memória dos jovens, fazendo-os construir pensamentos numa velocidade jamais vista, a não ser em tempos de dificuldades e calamidades. Os alunos pensavam em "dezenas de coisas" num pequeno espaço de tempo. Os professores compreenderam que toda vez que se aumenta a velocidade do pensamento gera-se ansiedade, inquietação e insatisfação.
Descobriram que atualmente o conhecimento dobra no máximo a cada cinco anos, o que no passado demorava séculos. O excesso de informações, somado ao desespero pelo consumo, a preocupação excessiva com a estética e a moda registravam-se no centro consciente da memória das pessoas, deixando inúmeros arquivos abertos.
A mente dos alunos não parava de acessar as informações desses arquivos, como um computador que não parava de operar, gerando uma produção intensa de pensamentos sobre atividades, preocupações, coisas do amanhã. Desenvolviam vários sintomas. Tranqüilidade nem para remédio. Paciência evaporou-se.
Além de ansiosos, são irritados, possuem uma emoção flutuante, num momento estão alegres, noutro, explosivos. Não se concentram, não se interiorizam e ainda por cima detestam a rotina, por isso não se cansam de dizer: "não tem nada para fazer nesta casa!".
E a sala de aula? Freqüentemente é o último lugar em que querem estar. Para quem tem SPA, os professores são chatos, as aulas são insuportáveis, o sinal de término de aula é uma maravilha. A agitação dos pensamentos e a ansiedade são tão intensas que
os jovens não extraem experiências dos seus erros e sofrimentos. A troca do cenário no palco da mente deles é tão rápida que eles não elaboram as experiências, não refletem sobre novas atitudes, não crescem diante das dificuldades. Continuam imaturos, mesmo adultos.
Para Romanov e seus colegas, os professores eram cozinheiros do conhecimento, que preparavam o alimento para nutrir a inteligência de uma platéia sem apetite. Nada é mais frustrante para um mestre do que ensinar para quem não quer aprender. Por isso, a grande maioria dos educadores estava adoecendo nas sociedades modernas.
Milhares de professores estavam se deprimindo, desenvolvendo pânico, doenças físicas, não apenas devido aos seus problemas internos, mas à crise da educação. Alguns tinham sintomas cardíacos em sala de aula, outros desenvolviam gastrites e úlceras. Muitos sabiam que a educação estava no caos, mas, por não estudarem a construção dos pensamentos, não sabiam que alteramos o seu ritmo.
As crianças não corriam mais atrás das borboletas, não brincavam nas árvores, não soltavam pipas. Os jovens não contemplavam o belo, não inventavam, não libertavam sua imaginação e nem viviam a vida com aventura. Transformaram-se em consumidores.
Algumas pessoas culpavam os pais por não colocar limites nos seus filhos. Entretanto, Júlio César e Romanov descobriram que os pais tentavam colocar limites, mas, devido à ansiedade gerada pela SPA, não conseguiam. Pais e mães estavam confusos e inseguros, sem saber como agir diante dos seus filhos. No passado, um olhar de um pai ou mãe causava um impacto nos filhos, atualmente nem os gritos causavam alguma reação.
A destruição da auto-estima
Alguns professores agrediam os alunos pensando que eles eram culpados por tamanha agitação. Não sabiam que o sistema social era o grande criminoso, que foi ele quem provocou uma ansiedade desumana no teatro da mente dos jovens. Pior ainda, não sabiam que, além da SPA, o sistema estava destruindo a auto-estima das pessoas, colocando modelos magérrimas pelos padrões da medicina como parâmetro do belo e da auto-satisfação.
O padrão incomum de beleza difundido na sociedade penetrava no inconsciente coletivo dos jovens, produzia conflitos com a auto-imagem e gerava uma rejeição pelo próprio corpo. Milhões de jovens chegavam diante do espelho e pareciam se perguntar: espelho, espelho meu, existe alguém com mais defeitos do que eu?
Muitos sentiam que nenhuma roupa lhes caía bem. Alguns se deprimiam, outros desenvolviam anorexia nervosa, bloqueavam o apetite e emagreciam muito e ainda outros desenvolviam bulimia, comiam sem parar e depois provocavam vômitos. Havia até aqueles que desenvolviam vigorexia, malhavam sem parar nas academias e tomavam remédios sem orientação médica para ganhar massa muscular para ser valorizados. Não sabiam que o maior valor estava na inteligência que possuíam.
Os jovens não sabiam que a grande maioria das modelos também sofria com a ditadura da beleza, sempre rejeitavam uma área do corpo, faziam regimes maquiavélicos para não ser rejeitadas. Muitas desenvolviam também anorexia, bulimia e depressão. Mendigavam o pão da auto-estima. O sistema as usava e as descartava se ganhassem alguns quilos a mais.
Os professores queriam gritar para os jovens que a beleza está nos olhos do observador. Mas, devido à síndrome do pensamento acelerado e à ditadura da beleza, os jovens não se observavam como belos, bonitos, tanto interiormente quanto exteriormente.
Com auto-estima zerada ou diminuída, os jovens tornavam-se insatisfeitos e canalizavam sua insatisfação para consumir mais. Assim, tornavam-se presas do mais agressivo predador: o mercado.
Júlio César, Romanov e seus colegas queriam que todos os jovens tivessem um caso de amor consigo mesmos e fossem revolucionários na sociedade. Revolucionários que criticassem o sistema social, que consumissem mais idéias do que bens materiais e que tivessem a coragem de não comprar em lojas e empresas que só usavam modelos magras para vender seus produtos.
— Abram seus olhos! Não sejam escravos do padrão de beleza da mídia! — eles diziam. E acrescentavam: — Cada um de vocês possui uma beleza única, especial, inigualável, não importam seu peso, sua altura, a cor da sua pele nem a anatomia do seu corpo.
Por colocar música ambiente em sala de aula, tal como o som da música de Beethoven, Bach, Mozart, Chopin, cada aula se tornava um espetáculo. Além da música ambiente, por fazer os alunos sentarem-se em círculo e debater as idéias, os professores
conseguiram aliviar a SPA e diminuir pelo menos 50% da ansiedade de seus alunos. Dia a dia a escola passava por transformações.
Estava ocorrendo algo encantador: os alunos estavam aprendendo a ter uma mente livre, a questionar a si mesmos e ao mundo, como o jovem filósofo Platão aprendera com Sócrates. Porém, era preciso avançar muito.
Os professores, estimulados pelo intrépido Romanov, resolveram não apenas contar algumas histórias de vida em sala de aula, mas também humanizar o conhecimento, ou seja, falar sobre a vida dos cientistas, comentar seus defeitos, desafios, lágrimas, ousadias e rejeições que sofreram.
Queriam que os jovens abrissem os horizontes da sua inteligência por entender que, por detrás de cada aula que presenciavam, existiam as dificuldades dos pensadores. Desse modo, o conhecimento deixou de ser insosso e passou a ter um tempero existencial.
Comentaram sobre os medos, a coragem e as angústias de Einstein. Disseram que foi um grande gênio, que produziu excelentes idéias, mas errou também. Errou principalmente ao deixar seu filho doente mental num hospital psiquiátrico por mais de vinte anos e nunca mais o ter visitado. Os alunos entenderam que o gênio da física conheceu muitíssimo o mundo de fora, o físico, mas tinha seus problemas, como todo ser humano, no mais complexo dos mundos, o psíquico.
Desse modo, percebiam que ninguém era perfeito, seja professores, seja pensadores. Assim, aprendiam dia a dia a deixar de ser repetidores de informação e perdiam o medo de pensar e produzir conhecimento. Havia reflexo até nas provas, os alunos passaram a ser mais inventivos. Todo esse caminho produzia finalmente uma educação que inspirava a emoção, libertava a inteligência, expandia o imaginário.
Agredindo um colega: o fenômeno bullying
Bons professores conhecem bem sua matéria, professores fascinantes conhecem o funcionamento da mente. Por se dedicar em ser um professor fascinante, o professor Júlio César foi aprendendo a lidar com conflitos em sala de aula, com as discussões entre alunos e com os atritos dos alunos com seus professores. Mas de vez em quando esses conflitos eram tão graves que o tumulto parecia incontrolável.
Certa vez, presenciou uma reação entre dois alunos que o abalou. Viu Alex ofendendo intensamente Fernando. Fernando vivia viajando nos seus pensamentos, era distraído, não se concentrava, sofria por antecipação, preocupava-se muito com as coisas que não aconteciam. A ansiedade dele era bem intensa. Além disso, tinha dificuldade de aprendizado. Não conseguia acompanhar a classe.
O jovem era tão disperso que freqüentemente fazia perguntas sobre um assunto que o professor havia acabado de explicar. Outras vezes, fazia comentários que nada tinham a ver com o assunto tratado. Muitos dos seus colegas zombavam dele pelas costas.
Os alunos não sabiam o valor da inclusão, a importância de conviver com pessoas diferentes. Não compreendiam que os maiores erros cometidos pela humanidade ocorreram por não aceitar e respeitar pessoas diferentes, seja no campo intelectual, social, racial, cultural ou religioso.
Júlio César era paciente com Fernando e admirava sua participação. Como Romanov, pensava que jovens calados são bons para formar um exército, mas não um time de pensadores. Não queria uma platéia de robôs.
Após Fernando fazer mais uma pergunta sem relação aparente com o assunto ensinado, Alex não se agüentou e gritou do fundo da classe:
— Burro! Mongolóide! Acorda!
A turma caiu em gargalhadas. Alex era considerado o líder da turma e Fernando era considerado o patinho feio da classe. Humilhado, lacrimejou os olhos, sentiu um nó na garganta. Logo depois, levantou-se e ameaçou sair do ambiente.
Júlio César imediatamente fez uma intervenção:
— Por favor, Fernando, não saia. — E olhando para toda a classe e depois para o agressor, comentou: — Você acabou de cometer um grave erro contra seu colega. Zombou de sua capacidade intelectual. Fez dele um palhaço e objeto de deboche diante de toda a turma. Sabia que muitos pensadores tinham o perfil psicológico de Fernando? Eles brilharam porque não tiveram medo de perguntar, de se expressar.
Alex tentou disfarçar escondendo seu rosto. Mas o professor fez uma célebre defesa da inclusão social. Disse que quem não é capaz de aceitar pessoas diferentes comete atrocidades nas relações sociais. Comentou sobre a escravidão dos negros, a morte de seis milhões de judeus na Segunda Grande Guerra, conflitos entre cristãos e muçulmanos na história, a turbulência na região da Caxemira na índia e em muitos outros lugares.
Comentou ainda que a nossa espécie está doente, doente pela discriminação, pela falta de respeito, solidariedade, pela dificuldade de inclusão social. E acrescentou:
— Os fracos julgam e excluem, mas os fortes incluem e compreendem. — Em seguida, ainda não satisfeito, perguntou para Alex: — Sabe como se chama esse tipo de agressividade entre os colegas?
Alex não soube responder. Em seguida, o professor fez a mesma pergunta para a classe. Mas ninguém sabia a resposta.
— Fenômeno bullying — respondeu com segurança.
— Que fenômeno é esse? — perguntou Joana, curiosa.
— Bully quer dizer valente, agressor. Toda vez que os colegas agridem, diminuem, discriminam ou rotulam outros colegas, eles cometem o fenômeno bullying, se tornam agressores, controladores e até carrascos emocionais deles. Entre as crianças e adolescentes existem muitas brincadeiras. Algumas são saudáveis, estimulam a criatividade e o prazer. Entretanto, outras machucam profundamente a emoção e geram traumas na personalidade.
Alex engoliu saliva e calou-se. Júlio César também havia sido vitima do fenômeno bullying na adolescência. O assunto tocava-lhe fundo, por isso resolveu falar sobre alguns segredos da mente humana para compreenderem melhor como esse fenômeno pode prejudicar drasticamente a formação da personalidade.
Não é possível deletar a memória
— O registro na memória é involuntário. Todas as idéias, pensamentos, imagens mentais, emoções, sejam tolas ou inteligentes, lúcidas ou perturbadoras, são registradas automaticamente.
— Professor, mas nos computadores eu registro o que eu quero! — afirmou Márcia.
— Sim, mas, na memória humana, você não tem essa opção. O fenômeno RAM (Registro Automático da Memória) arquiva tudo automaticamente. Isso é fácil de perceber pela nossa experiência. Porém devemos também compreender que todas as experiências que têm mais emoção, sejam prazeres ou sofrimentos, tranqüilidade ou medo, são registradas de maneira privilegiada. Por isso, recordamos com facilidade
principalmente os momentos mais marcantes de nossas vidas. — Após dizer tais palavras, o professor perguntou: — Podemos apagar ou deletar o que está arquivado?
Luís se adiantou e respondeu:
— Creio que sim, pois nos computadores a coisa mais fácil é apagar os arquivos.
— Você já tentou apagar da sua memória um problema que atravessou?
Luís há dois dias tinha perdido duzentos reais. Tentava apagar da sua mente essa perda, mas, quanto mais tentava, mais pensava no assunto.
— Não! — disse Luís sem delongas.
Em seguida, Júlio César perguntou a Alex com delicadeza:
— Você tentou deletar da sua memória quem você ofendeu ou decepcionou?
O aluno ficou vermelho, percebeu onde seu professor quis chegar. Alex havia levado um fora da sua namorada há um mês. Por querer controlá-la e ao mesmo tempo achar que podia ficar com uma garota por semana, ela rompeu a relação e nem telefonema dele atende mais. Ele tentava esquecê-la, mas pensava dia e noite nela.
— Queria deletar alguns arquivos ruins da minha memória, mas não consigo — disse com sinceridade, começando a ficar consciente da injustiça que praticou com Fernando.
O professor tomou a dianteira e disse:
— Ninguém consegue deletar a memória, até porque ninguém sabe onde esses arquivos estão alojados no córtex cerebral, que é o local do cérebro onde as experiências são registradas. Só podemos superar os traumas atuando nos sintomas que eles desenvolvem ou resgatando nossa história, nos auto-conhecendo, descobrindo como e quando os desenvolvemos. Às vezes, quando o trauma é importante, precisamos da ajuda de profissionais da psicologia.
Em seguida, suspirou e disse que a agressividade e humilhação geradas pelo fenômeno bullying eram arquivados de maneira privilegiada na memória, podendo gerar traumas significativos.
Alguns alunos gelaram. Começaram a entender que pequenos gestos podem gerar grandes conseqüências. Vendo os alunos pensativos, o professor olhou para Fernando e corajosamente procurou resolver o conflito em sala de aula:
— Os fracos julgam e excluem os outros por serem diferentes, mas os fortes compreendem e incluem. Que é ser ofendido? Que fazer quando ofendido? Ter raiva? Sair da classe? Vingar-se? Ou fazer a oração dos sábios?
O professor, influenciado por Romanov, ensinava perguntando, provocava a mente de seus alunos como Sócrates fazia com seus discípulos. Era impossível não pensar. Curioso, Fernando perguntou:
— Nunca ouvi falar da oração dos sábios. Qual é?
— O silêncio. Só o silêncio contém a sabedoria quando a vida está ameaçada, sob risco, pressão, ofensa — disse o sábio professor. E adicionou: — Quem consegue raciocinar com brilho quando está nervoso? Na esfera do silêncio você deve abrir o leque da inteligência, romper as algemas dos arquivos doentios que financiam o medo, o ódio, a timidez, e procurar a mais excelente resposta.
Enquanto orientava Fernando, Alex ficava em profundo silêncio pensando. Os alunos estavam aprendendo a caminhar nas trajetórias do seu próprio ser. Estavam aprendendo a proteger sua emoção, reeditar os arquivos doentios do seu inconsciente.
O professor acreditava que se os alunos de todas as escolas da Terra aprendessem a fazer esse passeio pelo seu interior, aprendessem a arte da reflexão e, ao mesmo tempo, desenvolvessem habilidade para dialogar sem medo sobre seus problemas e conflitos, poder-se-ia prevenir milhares de traumas e até evitar suicídios.
Júlio César pediu para todos os alunos procurar seus pais, professor ou um amigo experiente em quem confiavam para contar os problemas mais graves. Ele valorizava muito a psiquiatria e a psicologia clínica, mas sentia que devíamos investir nossos esforços na prevenção pela educação, pois todos concordavam que a prevenção era a área mais fundamental da medicina.
Momentos depois, o professor perguntou de maneira genérica:
— Alguém aqui já se sentiu diminuído por algum colega?
Por incrível que pareça, mais de 80% da classe levantou as mãos. Alex também se sentiu diminuído nos primeiros três anos de escola. Ele era muito ansioso e espalhafatoso, não tinha coordenação motora, sentia-se um péssimo esportista. Sua atitude de agredir era uma projeção da agressividade que recebeu e que nunca foi resolvida. Por refletir sobre sua história, caiu em si.
Beija! Beija! A festa depois do caos
O professor ficou preocupado com o número de pessoas que levantou as mãos. Não esperava uma proporção tão grande. Em seguida, escreveu na lousa:
Nunca valorizem um defeito físico de alguém ou um comportamento de alguém que vocês achem estranho. Valorizem suas qualidades e respeitem as diferenças. Jamais coloquem apelidos que diminuam as pessoas. Mesmo em tom de brincadeira, não copiem os programas de humor que debocham das características dos outros para fazer a platéia rir. Os verdadeiros pensadores são apaixonados pela humanidade, conseguem colocar-se no lugar dos outros e enxergar o invisível.
Nesse momento, Alex captou Fernando com os olhos. Fez um sinal de positivo para ele, como se quisesse pedir desculpa. Os que perceberam esse gesto brincaram, gritando:
— Beija! Beija!
Percebendo que Alex ficou inibido diante da turma, Fernando levantou-se, foi até seu ofensor e disse-lhe:
— Eu o perdôo.
Numa atitude surpreendente, Alex levantou-se, deu-lhe um abraço e respondeu:
— Desculpe-me, eu fui um fraco.
— Não, reconhecer seu erro, o torna forte — reagiu Fernando.
A classe aplaudiu. O clima estava tão agradável que o professor falou sobre o excelente código de ética do personagem mais famoso da história, o Mestre dos mestres, Jesus:
— Não façam para os outros o que vocês não querem que os outros façam para vocês.
O Mestre dos mestres respeitava incondicionalmente o ser humano. Ele valorizava mais a pessoa que erra do que os erros cometidos. Tratou com gentileza até seu traidor, Judas Iscariotes. Deu-lhe oportunidade até o último momento para ele reescrever sua história.
Em seguida, o professor disse que, se os alunos não querem ser ofendidos, que não ofendam. Se não querem ser rejeitados, que incluam. Se desejam ser elogiados, elogiem. Se querem o carinho e a atenção dos outros, dêem-lhes primeiramente seu apoio, coloquem-se à disposição de quem precisa. A ética de Jesus Cristo está no centro da educação para a paz. Se as sociedades vivessem esse princípio, não haveria lutas religiosas, os generais seriam jardineiros, os policiais, poetas, as indústrias de armas se transformariam em indústrias de alimentos, as guerras seriam apenas cicatrizes nos textos de história.
Os alunos ficaram fascinados. De repente, um deles fez uma pergunta fatal:
— Professor, você também foi humilhado por seus colegas na escola? — indagou Mário, pensativo e sem inibição.
Pego de surpresa, Júlio César fez a oração dos sábios. Após um momento de reflexão, resolveu contar alguns capítulos da sua vida que lhe trouxeram grande sofrimento. Sentiu que era o momento de se humanizar, cruzar a sua história com a história dos seus alunos. Inundado por intensa emoção, ele disse:
— Nos primeiros anos de escola eu sofri muito. Perdi meu pai quando eu tinha nove anos de idade. Jogávamos futebol, pescávamos e passeávamos juntos freqüentemente. Ele era meu melhor amigo. Era valente, forte, parecia imbatível, mas um dia sofreu um infarto fulminante. Da noite para o dia, perdi meu ponto de apoio — disse o professor, intensamente comovido.
Após uma pausa, continuou: — Além da dor insuportável de perder meu pai, um ano depois alguns colegas começaram a zombar de mim por causa da minha estatura e pelo tamanho do meu nariz. Estão vendo meu enorme tamanho? — brincou.
Os alunos sorriram. Em seguida, brincou novamente:
— Estão vendo essa bela ferramenta de respirar? Meu nariz não é lindo? — e apontou para seu avantajado nariz de descendente de italiano. — Sabem qual eram os apelidos que me machucaram muito na adolescência? — E respondeu em seguida: — Tampinha e Tucano. Vejam que as palavras até combinam — falou em tom de humor para uma classe que se deliciava em ouvi-lo. — Felizmente superei meus conflitos, mas vocês não imaginam a dor que senti por me sentir rejeitado. A dor da rejeição é uma das mais dramáticas experiências psíquicas. Sentia-me inferior aos amigos. Era inseguro, fechado, tinha medo de me aproximar de uma garota. — E brincou: — Hoje sei que sou lindo!
Para finalizar, o professor pediu para os alunos se levantarem, se abraçarem e dizerem uns para os outros que eram lindos. Foi uma festa. O diretor, ouvindo as gargalhadas, assustou-se. Dirigiu-se apressado até a classe. Ficou boquiaberto com tanta alegria.
Romanov também se dirigiu apressadamente ao local. Entrou no clima, abraçou muitos alunos. Afinal de contas, um dia os colegas e professores se separariam. Muitos teriam saudades uns dos outros, mas nunca mais se veriam. Portanto, tinham de aprender a se curtir e a criar amizades com raízes que suportariam os invernos da existência.
Capítulo 2
Bons alunos são repetidores
de informações, alunos fascinantes
são pensadores
Uma mente agitada
O professor Júlio César era super engraçado e, ao mesmo tempo, tinha uma inteligência muito aguçada. No começo, rejeitava as idéias de Romanov, mas, à medida que se conheceram, tornaram-se amigos inseparáveis.
Romanov disse-lhe certa vez um pensamento inesquecível que ele anotou no espelho do seu banheiro:
Os professores não são valorizados socialmente como merecem, não estão nos noticiários da TV, vivem no anonimato da sala de aula, mas são os únicos que têm o poder de causar uma revolução social. Com uma das mãos eles escrevem na lousa, com a outra, movem o mundo, pois trabalham com a maior riqueza da sociedade: a juventude. Cada aluno é um diamante que, bem lapidado, brilhará para sempre.
O pensamento de Romanov renovou a paixão de Júlio César pela educação. Ele era professor de línguas havia mais de 15 anos, mas estava desanimado e perplexo nos
últimos tempos por observar o aumento gradual de ansiedade dos alunos. Percebia que a mente deles estava cada vez mais agitada e inquieta. As conversas paralelas e a agressividade haviam se expandido muitíssimo.
Júlio César, Romanov, Jéferson e outros professores procuraram uma explicação desse comportamento dos alunos, que se tornara um fenômeno mundial. Depois de exaustivas pesquisas descobriram finalmente uma hipótese da síndrome SPA, Síndrome do Pensamento Acelerado, que explicava que a edição dos eventos da vida nas sociedades modernas atuava no teatro da mente humana e modificava a velocidade de construção dos pensamentos e das emoções.
As pessoas estavam agitadíssimas. Tudo era muito rápido. As pessoas comiam, falavam e trabalhavam aceleradamente. Até os filmes atuais tinham uma velocidade muito maior das cenas do que os filmes do passado.
Entenderam que os alunos não tinham culpa por ser ansiosos. O culpado era o sistema social que expandiu o número de necessidades, nem sempre necessárias, e o número de informações como nunca ocorreu na história, entulhando a memória dos jovens, fazendo-os construir pensamentos numa velocidade jamais vista, a não ser em tempos de dificuldades e calamidades. Os alunos pensavam em "dezenas de coisas" num pequeno espaço de tempo. Os professores compreenderam que toda vez que se aumenta a velocidade do pensamento gera-se ansiedade, inquietação e insatisfação.
Descobriram que atualmente o conhecimento dobra no máximo a cada cinco anos, o que no passado demorava séculos. O excesso de informações, somado ao desespero pelo consumo, a preocupação excessiva com a estética e a moda registravam-se no centro consciente da memória das pessoas, deixando inúmeros arquivos abertos.
A mente dos alunos não parava de acessar as informações desses arquivos, como um computador que não parava de operar, gerando uma produção intensa de pensamentos sobre atividades, preocupações, coisas do amanhã. Desenvolviam vários sintomas. Tranqüilidade nem para remédio. Paciência evaporou-se.
Além de ansiosos, são irritados, possuem uma emoção flutuante, num momento estão alegres, noutro, explosivos. Não se concentram, não se interiorizam e ainda por cima detestam a rotina, por isso não se cansam de dizer: "não tem nada para fazer nesta casa!".
E a sala de aula? Freqüentemente é o último lugar em que querem estar. Para quem tem SPA, os professores são chatos, as aulas são insuportáveis, o sinal de término de aula é uma maravilha. A agitação dos pensamentos e a ansiedade são tão intensas que
os jovens não extraem experiências dos seus erros e sofrimentos. A troca do cenário no palco da mente deles é tão rápida que eles não elaboram as experiências, não refletem sobre novas atitudes, não crescem diante das dificuldades. Continuam imaturos, mesmo adultos.
Para Romanov e seus colegas, os professores eram cozinheiros do conhecimento, que preparavam o alimento para nutrir a inteligência de uma platéia sem apetite. Nada é mais frustrante para um mestre do que ensinar para quem não quer aprender. Por isso, a grande maioria dos educadores estava adoecendo nas sociedades modernas.
Milhares de professores estavam se deprimindo, desenvolvendo pânico, doenças físicas, não apenas devido aos seus problemas internos, mas à crise da educação. Alguns tinham sintomas cardíacos em sala de aula, outros desenvolviam gastrites e úlceras. Muitos sabiam que a educação estava no caos, mas, por não estudarem a construção dos pensamentos, não sabiam que alteramos o seu ritmo.
As crianças não corriam mais atrás das borboletas, não brincavam nas árvores, não soltavam pipas. Os jovens não contemplavam o belo, não inventavam, não libertavam sua imaginação e nem viviam a vida com aventura. Transformaram-se em consumidores.
Algumas pessoas culpavam os pais por não colocar limites nos seus filhos. Entretanto, Júlio César e Romanov descobriram que os pais tentavam colocar limites, mas, devido à ansiedade gerada pela SPA, não conseguiam. Pais e mães estavam confusos e inseguros, sem saber como agir diante dos seus filhos. No passado, um olhar de um pai ou mãe causava um impacto nos filhos, atualmente nem os gritos causavam alguma reação.
A destruição da auto-estima
Alguns professores agrediam os alunos pensando que eles eram culpados por tamanha agitação. Não sabiam que o sistema social era o grande criminoso, que foi ele quem provocou uma ansiedade desumana no teatro da mente dos jovens. Pior ainda, não sabiam que, além da SPA, o sistema estava destruindo a auto-estima das pessoas, colocando modelos magérrimas pelos padrões da medicina como parâmetro do belo e da auto-satisfação.
O padrão incomum de beleza difundido na sociedade penetrava no inconsciente coletivo dos jovens, produzia conflitos com a auto-imagem e gerava uma rejeição pelo próprio corpo. Milhões de jovens chegavam diante do espelho e pareciam se perguntar: espelho, espelho meu, existe alguém com mais defeitos do que eu?
Muitos sentiam que nenhuma roupa lhes caía bem. Alguns se deprimiam, outros desenvolviam anorexia nervosa, bloqueavam o apetite e emagreciam muito e ainda outros desenvolviam bulimia, comiam sem parar e depois provocavam vômitos. Havia até aqueles que desenvolviam vigorexia, malhavam sem parar nas academias e tomavam remédios sem orientação médica para ganhar massa muscular para ser valorizados. Não sabiam que o maior valor estava na inteligência que possuíam.
Os jovens não sabiam que a grande maioria das modelos também sofria com a ditadura da beleza, sempre rejeitavam uma área do corpo, faziam regimes maquiavélicos para não ser rejeitadas. Muitas desenvolviam também anorexia, bulimia e depressão. Mendigavam o pão da auto-estima. O sistema as usava e as descartava se ganhassem alguns quilos a mais.
Os professores queriam gritar para os jovens que a beleza está nos olhos do observador. Mas, devido à síndrome do pensamento acelerado e à ditadura da beleza, os jovens não se observavam como belos, bonitos, tanto interiormente quanto exteriormente.
Com auto-estima zerada ou diminuída, os jovens tornavam-se insatisfeitos e canalizavam sua insatisfação para consumir mais. Assim, tornavam-se presas do mais agressivo predador: o mercado.
Júlio César, Romanov e seus colegas queriam que todos os jovens tivessem um caso de amor consigo mesmos e fossem revolucionários na sociedade. Revolucionários que criticassem o sistema social, que consumissem mais idéias do que bens materiais e que tivessem a coragem de não comprar em lojas e empresas que só usavam modelos magras para vender seus produtos.
— Abram seus olhos! Não sejam escravos do padrão de beleza da mídia! — eles diziam. E acrescentavam: — Cada um de vocês possui uma beleza única, especial, inigualável, não importam seu peso, sua altura, a cor da sua pele nem a anatomia do seu corpo.
Por colocar música ambiente em sala de aula, tal como o som da música de Beethoven, Bach, Mozart, Chopin, cada aula se tornava um espetáculo. Além da música ambiente, por fazer os alunos sentarem-se em círculo e debater as idéias, os professores
conseguiram aliviar a SPA e diminuir pelo menos 50% da ansiedade de seus alunos. Dia a dia a escola passava por transformações.
Estava ocorrendo algo encantador: os alunos estavam aprendendo a ter uma mente livre, a questionar a si mesmos e ao mundo, como o jovem filósofo Platão aprendera com Sócrates. Porém, era preciso avançar muito.
Os professores, estimulados pelo intrépido Romanov, resolveram não apenas contar algumas histórias de vida em sala de aula, mas também humanizar o conhecimento, ou seja, falar sobre a vida dos cientistas, comentar seus defeitos, desafios, lágrimas, ousadias e rejeições que sofreram.
Queriam que os jovens abrissem os horizontes da sua inteligência por entender que, por detrás de cada aula que presenciavam, existiam as dificuldades dos pensadores. Desse modo, o conhecimento deixou de ser insosso e passou a ter um tempero existencial.
Comentaram sobre os medos, a coragem e as angústias de Einstein. Disseram que foi um grande gênio, que produziu excelentes idéias, mas errou também. Errou principalmente ao deixar seu filho doente mental num hospital psiquiátrico por mais de vinte anos e nunca mais o ter visitado. Os alunos entenderam que o gênio da física conheceu muitíssimo o mundo de fora, o físico, mas tinha seus problemas, como todo ser humano, no mais complexo dos mundos, o psíquico.
Desse modo, percebiam que ninguém era perfeito, seja professores, seja pensadores. Assim, aprendiam dia a dia a deixar de ser repetidores de informação e perdiam o medo de pensar e produzir conhecimento. Havia reflexo até nas provas, os alunos passaram a ser mais inventivos. Todo esse caminho produzia finalmente uma educação que inspirava a emoção, libertava a inteligência, expandia o imaginário.
Agredindo um colega: o fenômeno bullying
Bons professores conhecem bem sua matéria, professores fascinantes conhecem o funcionamento da mente. Por se dedicar em ser um professor fascinante, o professor Júlio César foi aprendendo a lidar com conflitos em sala de aula, com as discussões entre alunos e com os atritos dos alunos com seus professores. Mas de vez em quando esses conflitos eram tão graves que o tumulto parecia incontrolável.
Certa vez, presenciou uma reação entre dois alunos que o abalou. Viu Alex ofendendo intensamente Fernando. Fernando vivia viajando nos seus pensamentos, era distraído, não se concentrava, sofria por antecipação, preocupava-se muito com as coisas que não aconteciam. A ansiedade dele era bem intensa. Além disso, tinha dificuldade de aprendizado. Não conseguia acompanhar a classe.
O jovem era tão disperso que freqüentemente fazia perguntas sobre um assunto que o professor havia acabado de explicar. Outras vezes, fazia comentários que nada tinham a ver com o assunto tratado. Muitos dos seus colegas zombavam dele pelas costas.
Os alunos não sabiam o valor da inclusão, a importância de conviver com pessoas diferentes. Não compreendiam que os maiores erros cometidos pela humanidade ocorreram por não aceitar e respeitar pessoas diferentes, seja no campo intelectual, social, racial, cultural ou religioso.
Júlio César era paciente com Fernando e admirava sua participação. Como Romanov, pensava que jovens calados são bons para formar um exército, mas não um time de pensadores. Não queria uma platéia de robôs.
Após Fernando fazer mais uma pergunta sem relação aparente com o assunto ensinado, Alex não se agüentou e gritou do fundo da classe:
— Burro! Mongolóide! Acorda!
A turma caiu em gargalhadas. Alex era considerado o líder da turma e Fernando era considerado o patinho feio da classe. Humilhado, lacrimejou os olhos, sentiu um nó na garganta. Logo depois, levantou-se e ameaçou sair do ambiente.
Júlio César imediatamente fez uma intervenção:
— Por favor, Fernando, não saia. — E olhando para toda a classe e depois para o agressor, comentou: — Você acabou de cometer um grave erro contra seu colega. Zombou de sua capacidade intelectual. Fez dele um palhaço e objeto de deboche diante de toda a turma. Sabia que muitos pensadores tinham o perfil psicológico de Fernando? Eles brilharam porque não tiveram medo de perguntar, de se expressar.
Alex tentou disfarçar escondendo seu rosto. Mas o professor fez uma célebre defesa da inclusão social. Disse que quem não é capaz de aceitar pessoas diferentes comete atrocidades nas relações sociais. Comentou sobre a escravidão dos negros, a morte de seis milhões de judeus na Segunda Grande Guerra, conflitos entre cristãos e muçulmanos na história, a turbulência na região da Caxemira na índia e em muitos outros lugares.
Comentou ainda que a nossa espécie está doente, doente pela discriminação, pela falta de respeito, solidariedade, pela dificuldade de inclusão social. E acrescentou:
— Os fracos julgam e excluem, mas os fortes incluem e compreendem. — Em seguida, ainda não satisfeito, perguntou para Alex: — Sabe como se chama esse tipo de agressividade entre os colegas?
Alex não soube responder. Em seguida, o professor fez a mesma pergunta para a classe. Mas ninguém sabia a resposta.
— Fenômeno bullying — respondeu com segurança.
— Que fenômeno é esse? — perguntou Joana, curiosa.
— Bully quer dizer valente, agressor. Toda vez que os colegas agridem, diminuem, discriminam ou rotulam outros colegas, eles cometem o fenômeno bullying, se tornam agressores, controladores e até carrascos emocionais deles. Entre as crianças e adolescentes existem muitas brincadeiras. Algumas são saudáveis, estimulam a criatividade e o prazer. Entretanto, outras machucam profundamente a emoção e geram traumas na personalidade.
Alex engoliu saliva e calou-se. Júlio César também havia sido vitima do fenômeno bullying na adolescência. O assunto tocava-lhe fundo, por isso resolveu falar sobre alguns segredos da mente humana para compreenderem melhor como esse fenômeno pode prejudicar drasticamente a formação da personalidade.
Não é possível deletar a memória
— O registro na memória é involuntário. Todas as idéias, pensamentos, imagens mentais, emoções, sejam tolas ou inteligentes, lúcidas ou perturbadoras, são registradas automaticamente.
— Professor, mas nos computadores eu registro o que eu quero! — afirmou Márcia.
— Sim, mas, na memória humana, você não tem essa opção. O fenômeno RAM (Registro Automático da Memória) arquiva tudo automaticamente. Isso é fácil de perceber pela nossa experiência. Porém devemos também compreender que todas as experiências que têm mais emoção, sejam prazeres ou sofrimentos, tranqüilidade ou medo, são registradas de maneira privilegiada. Por isso, recordamos com facilidade
principalmente os momentos mais marcantes de nossas vidas. — Após dizer tais palavras, o professor perguntou: — Podemos apagar ou deletar o que está arquivado?
Luís se adiantou e respondeu:
— Creio que sim, pois nos computadores a coisa mais fácil é apagar os arquivos.
— Você já tentou apagar da sua memória um problema que atravessou?
Luís há dois dias tinha perdido duzentos reais. Tentava apagar da sua mente essa perda, mas, quanto mais tentava, mais pensava no assunto.
— Não! — disse Luís sem delongas.
Em seguida, Júlio César perguntou a Alex com delicadeza:
— Você tentou deletar da sua memória quem você ofendeu ou decepcionou?
O aluno ficou vermelho, percebeu onde seu professor quis chegar. Alex havia levado um fora da sua namorada há um mês. Por querer controlá-la e ao mesmo tempo achar que podia ficar com uma garota por semana, ela rompeu a relação e nem telefonema dele atende mais. Ele tentava esquecê-la, mas pensava dia e noite nela.
— Queria deletar alguns arquivos ruins da minha memória, mas não consigo — disse com sinceridade, começando a ficar consciente da injustiça que praticou com Fernando.
O professor tomou a dianteira e disse:
— Ninguém consegue deletar a memória, até porque ninguém sabe onde esses arquivos estão alojados no córtex cerebral, que é o local do cérebro onde as experiências são registradas. Só podemos superar os traumas atuando nos sintomas que eles desenvolvem ou resgatando nossa história, nos auto-conhecendo, descobrindo como e quando os desenvolvemos. Às vezes, quando o trauma é importante, precisamos da ajuda de profissionais da psicologia.
Em seguida, suspirou e disse que a agressividade e humilhação geradas pelo fenômeno bullying eram arquivados de maneira privilegiada na memória, podendo gerar traumas significativos.
Alguns alunos gelaram. Começaram a entender que pequenos gestos podem gerar grandes conseqüências. Vendo os alunos pensativos, o professor olhou para Fernando e corajosamente procurou resolver o conflito em sala de aula:
— Os fracos julgam e excluem os outros por serem diferentes, mas os fortes compreendem e incluem. Que é ser ofendido? Que fazer quando ofendido? Ter raiva? Sair da classe? Vingar-se? Ou fazer a oração dos sábios?
O professor, influenciado por Romanov, ensinava perguntando, provocava a mente de seus alunos como Sócrates fazia com seus discípulos. Era impossível não pensar. Curioso, Fernando perguntou:
— Nunca ouvi falar da oração dos sábios. Qual é?
— O silêncio. Só o silêncio contém a sabedoria quando a vida está ameaçada, sob risco, pressão, ofensa — disse o sábio professor. E adicionou: — Quem consegue raciocinar com brilho quando está nervoso? Na esfera do silêncio você deve abrir o leque da inteligência, romper as algemas dos arquivos doentios que financiam o medo, o ódio, a timidez, e procurar a mais excelente resposta.
Enquanto orientava Fernando, Alex ficava em profundo silêncio pensando. Os alunos estavam aprendendo a caminhar nas trajetórias do seu próprio ser. Estavam aprendendo a proteger sua emoção, reeditar os arquivos doentios do seu inconsciente.
O professor acreditava que se os alunos de todas as escolas da Terra aprendessem a fazer esse passeio pelo seu interior, aprendessem a arte da reflexão e, ao mesmo tempo, desenvolvessem habilidade para dialogar sem medo sobre seus problemas e conflitos, poder-se-ia prevenir milhares de traumas e até evitar suicídios.
Júlio César pediu para todos os alunos procurar seus pais, professor ou um amigo experiente em quem confiavam para contar os problemas mais graves. Ele valorizava muito a psiquiatria e a psicologia clínica, mas sentia que devíamos investir nossos esforços na prevenção pela educação, pois todos concordavam que a prevenção era a área mais fundamental da medicina.
Momentos depois, o professor perguntou de maneira genérica:
— Alguém aqui já se sentiu diminuído por algum colega?
Por incrível que pareça, mais de 80% da classe levantou as mãos. Alex também se sentiu diminuído nos primeiros três anos de escola. Ele era muito ansioso e espalhafatoso, não tinha coordenação motora, sentia-se um péssimo esportista. Sua atitude de agredir era uma projeção da agressividade que recebeu e que nunca foi resolvida. Por refletir sobre sua história, caiu em si.
Beija! Beija! A festa depois do caos
O professor ficou preocupado com o número de pessoas que levantou as mãos. Não esperava uma proporção tão grande. Em seguida, escreveu na lousa:
Nunca valorizem um defeito físico de alguém ou um comportamento de alguém que vocês achem estranho. Valorizem suas qualidades e respeitem as diferenças. Jamais coloquem apelidos que diminuam as pessoas. Mesmo em tom de brincadeira, não copiem os programas de humor que debocham das características dos outros para fazer a platéia rir. Os verdadeiros pensadores são apaixonados pela humanidade, conseguem colocar-se no lugar dos outros e enxergar o invisível.
Nesse momento, Alex captou Fernando com os olhos. Fez um sinal de positivo para ele, como se quisesse pedir desculpa. Os que perceberam esse gesto brincaram, gritando:
— Beija! Beija!
Percebendo que Alex ficou inibido diante da turma, Fernando levantou-se, foi até seu ofensor e disse-lhe:
— Eu o perdôo.
Numa atitude surpreendente, Alex levantou-se, deu-lhe um abraço e respondeu:
— Desculpe-me, eu fui um fraco.
— Não, reconhecer seu erro, o torna forte — reagiu Fernando.
A classe aplaudiu. O clima estava tão agradável que o professor falou sobre o excelente código de ética do personagem mais famoso da história, o Mestre dos mestres, Jesus:
— Não façam para os outros o que vocês não querem que os outros façam para vocês.
O Mestre dos mestres respeitava incondicionalmente o ser humano. Ele valorizava mais a pessoa que erra do que os erros cometidos. Tratou com gentileza até seu traidor, Judas Iscariotes. Deu-lhe oportunidade até o último momento para ele reescrever sua história.
Em seguida, o professor disse que, se os alunos não querem ser ofendidos, que não ofendam. Se não querem ser rejeitados, que incluam. Se desejam ser elogiados, elogiem. Se querem o carinho e a atenção dos outros, dêem-lhes primeiramente seu apoio, coloquem-se à disposição de quem precisa. A ética de Jesus Cristo está no centro da educação para a paz. Se as sociedades vivessem esse princípio, não haveria lutas religiosas, os generais seriam jardineiros, os policiais, poetas, as indústrias de armas se transformariam em indústrias de alimentos, as guerras seriam apenas cicatrizes nos textos de história.
Os alunos ficaram fascinados. De repente, um deles fez uma pergunta fatal:
— Professor, você também foi humilhado por seus colegas na escola? — indagou Mário, pensativo e sem inibição.
Pego de surpresa, Júlio César fez a oração dos sábios. Após um momento de reflexão, resolveu contar alguns capítulos da sua vida que lhe trouxeram grande sofrimento. Sentiu que era o momento de se humanizar, cruzar a sua história com a história dos seus alunos. Inundado por intensa emoção, ele disse:
— Nos primeiros anos de escola eu sofri muito. Perdi meu pai quando eu tinha nove anos de idade. Jogávamos futebol, pescávamos e passeávamos juntos freqüentemente. Ele era meu melhor amigo. Era valente, forte, parecia imbatível, mas um dia sofreu um infarto fulminante. Da noite para o dia, perdi meu ponto de apoio — disse o professor, intensamente comovido.
Após uma pausa, continuou: — Além da dor insuportável de perder meu pai, um ano depois alguns colegas começaram a zombar de mim por causa da minha estatura e pelo tamanho do meu nariz. Estão vendo meu enorme tamanho? — brincou.
Os alunos sorriram. Em seguida, brincou novamente:
— Estão vendo essa bela ferramenta de respirar? Meu nariz não é lindo? — e apontou para seu avantajado nariz de descendente de italiano. — Sabem qual eram os apelidos que me machucaram muito na adolescência? — E respondeu em seguida: — Tampinha e Tucano. Vejam que as palavras até combinam — falou em tom de humor para uma classe que se deliciava em ouvi-lo. — Felizmente superei meus conflitos, mas vocês não imaginam a dor que senti por me sentir rejeitado. A dor da rejeição é uma das mais dramáticas experiências psíquicas. Sentia-me inferior aos amigos. Era inseguro, fechado, tinha medo de me aproximar de uma garota. — E brincou: — Hoje sei que sou lindo!
Para finalizar, o professor pediu para os alunos se levantarem, se abraçarem e dizerem uns para os outros que eram lindos. Foi uma festa. O diretor, ouvindo as gargalhadas, assustou-se. Dirigiu-se apressado até a classe. Ficou boquiaberto com tanta alegria.
Romanov também se dirigiu apressadamente ao local. Entrou no clima, abraçou muitos alunos. Afinal de contas, um dia os colegas e professores se separariam. Muitos teriam saudades uns dos outros, mas nunca mais se veriam. Portanto, tinham de aprender a se curtir e a criar amizades com raízes que suportariam os invernos da existência.
Capítulo 4 - Bons filhos têm sonhos ou disciplina, filhos brilhantes tem sonhos e disciplina
Capítulo 4
Bons filhos têm sonhos ou
disciplina, filhos brilhantes
têm sonhos e disciplina.
O mais complexo dos planetas:
a mente humana
O professor Romanov dava excelentes aulas de física. Certa vez, levou os alunos a compreender as poderosas forças do universo. Revelou a impressionante força gravitacional entre os planetas e as estrelas. Comentou que muitas estrelas já foram destruídas e que a luz que víamos delas eram apenas os traços do seu passado. Disse ainda que no centro das galáxias existiam os fantásticos buracos negros, cuja força gravitacional era tão grande que sugava e destruía planetas e estrelas inteiros.
— Não duraríamos um milésimo de segundo se estivéssemos na proximidade desses buracos negros — comentou o professor para um extremamente atento grupo de alunos.
Falou que em muitos sistemas as estrelas e planetas se chocavam. Os alunos se arrepiaram, pois não sabiam disso. Pensaram na catástrofe se a Terra se chocasse com o Sol. Apenas a aproximação do Sol inviabilizaria a vida na Terra, imaginaram.
— Sabe quantas galáxias existem no universo? — perguntou Romanov. A maioria dos alunos não tinha a menor idéia.
— Um milhão — arriscou Leonardo, mas achava que estava exagerando.
— Muito mais — disse o professor. — Na realidade, hoje se sabe que há mais de cem bilhões de galáxias e a cada ano descobre-se um número maior. Moramos na Via Láctea, que é uma das inumeráveis galáxias do universo.
— E sabem quantos planetas e estrelas existem em cada galáxia? — novamente indagou o professor.
— Mais de cem — disse Júlia. Ela pensou que talvez houvesse apenas alguns sistemas solares dentro de cada galáxia.
— Mais de mil — respondeu Pedro.
— Erraram de novo. Em cada galáxia há milhões de planetas e estrelas. E imaginem que a Terra é apenas um desses planetas e o Sol é apenas uma dessas estrelas.
Os alunos ficaram perplexos. Nunca refletiram que o universo fosse tão grande. Todos faziam uma viagem espacial fantástica. Todos estavam vibrando, exceto uma aluna: Cláudia. Sua cabeça estava baixa, seu semblante entristecido. Cláudia parecia estar em outro planeta. E estava. Estava no mais complexo dos planetas, no planeta da sua mente, viajando nas suas idéias perturbadoras. Ultimamente ela estava ansiosa, sem concentração e roia as suas unhas.
Percebendo-a cabisbaixa, Romanov delicadamente perguntou:
— Querida Cláudia, o que está acontecendo? Você parece tão distante.
Cláudia levantou sua cabeça lentamente. Fez um momento solene de silêncio. Em seguida, como já havia aprendido um pouco com Romanov a não ter medo de falar o que pensa, respondeu:
— De que adianta conhecer as forças do universo se não tenho força para resolver meus problemas pessoais?
Romanov ficou chocado com seu raciocínio inteligente e realista. Em seguida, como se quisesse pôr para fora aquilo que a sufocava, Cláudia acrescentou:
— De que adianta conhecer outros planetas se nesse planeta há tantas misérias sem solução? O que me motiva a discutir sobre as imensas galáxias que estão a milhões de anos-luz, se o pequeno espaço da minha casa é um mundo opaco, se vejo meu pai triste, sem emprego fixo, sem condições de sobreviver e, pior ainda, sem esperança?
Os alunos ficaram abalados com sua resposta. O professor de física engoliu a seco as palavras de Cláudia. Ele pensou: "Ela tem razão. Por um lado, conhecer o
universo era importante para as pesquisas científicas, mas, por outro lado, muitas vezes a ciência está longe da realidade das pessoas, do mundo real e concreto dos seus alunos".
Romanov sabia que a ciência estava gerando gigantes na informação mas meninos na maturidade emocional, na formação como seres humanos. O sistema educacional do qual ele fazia parte estava seco, frio, distante, desumanizado.
Não poucos alunos da Escola dos Pesadelos eram financeiramente pobres. Alguns pais estavam desempregados ou subempregados, outros ganhavam tão pouco que mal conseguiam ganhar para sustentar sua família. Algumas mães deixavam de se alimentar para que seus filhos comessem um pouco melhor. Alguns pais não dormiam pensando no futuro dos seus filhos.
As dificuldades dos pais eram tão grandes que muitos alunos não tinham esperança de ter sucesso profissional. Pensavam que repetiriam a história deles, seriam humilhados, atravessariam crises financeiras, teriam pouco conforto. Como Cláudia, pensavam: "Se meus pais não tiveram oportunidade! para ter melhor qualidade de vida, dificilmente as teremos".
A esperança dos jovens era o estudo. Entretanto, os alunos saíam com um diploma nas mãos, mas a grande maioria não mudava suas histórias. Devido às aulas serem frias e distante» da realidade dos alunos, eles não desenvolviam espírito! empreendedor, ousadia, sonhos, capacidade crítica de pensar, habilidade para superar frustrações.
Mesmo nas escolas cujos pais eram ricos, os alunos saíam despreparados para os desafios da vida. Eles passavam nas provas curriculares, mas não nas provas sociais. Não sabiam! enfrentar seus problemas. Cresciam na sombra dos seus pais,] não eram autores da sua história. Muitos se tornavam torradores de herança. Eram poucos os que escapavam do velho ciclo da riqueza: avô rico, filho nobre, neto pobre. Muitos filhos de nobres conheciam o sabor da escassez e da miséria.
Romanov, por um lado, estava abalado com o pessimismo e realismo de Cláudia, por outro lado, estava feliz pela sua coragem de criticá-lo, de questionar sua postura em sala de aula. Os alunos estavam aprendendo a debater idéias, questionar seus mestres, criticar o conhecimento e sua utilidade. A Escola dos Pesadelos estava se tornando um canteiro para cultivar a inteligência e não um depósito de informações.
Levando os alunos a usar a força interior
O pensamento de Cláudia levou o professor a se interiorizar e mudar os rumos da aula. Começou a aplicar a física na vida diária. Comentou que há trilhões de planetas e moramos em um deles.
— É importante conquistar o espaço, mas não sabemos cuidar do nosso pequeno espaço, do nosso intrigante planeta. Anualmente novos rios eram poluídos, espécies são extintas e a temperatura global aumenta.
O instigante professor queria entrar no drama de Cláudia, mas ainda não era o momento. Fez algumas órbitas em outros assuntos, e acrescentou:
— Pensem um pouco. Apesar de sermos tão pequenos nesse imensurável universo, somos tão orgulhosos, estúpidos c agressivos, a ponto de nos acharmos donos do mundo. Na realidade, não somos donos de nada, nem da verdade, nem da nossa própria vida. Desenvolvemos tecnologias para nos comunicar com o mundo, para produzir veículos e construir edifícios, mas não desenvolvemos tecnologia para dialogar, para ser tranqüilos, alegres, felizes. Usamos a força para fazer guerras físicas ou guerras comerciais, mas não usamos a nossa força para dominar nossa ansiedade, intolerância, desespero, desesperança.
Os alunos começaram a desenvolver inteligência crítica sobre esses sérios assuntos. O professor admitiu publicamente que Cláudia tinha razão e acrescentou:
— Nós nos preocupamos tanto em informar que esquecemos de formar. O conhecimento está aqui para servi-los e não para que vocês sirvam o conhecimento. Mas, invertemos os valores. — E a estimulou perguntando: — De onde provém a maior força de um ser humano?
Cláudia pensou, pensou, mas não soube responder.
Depois, perguntou para a classe.
— Dos seus músculos — Helena respondeu.
— Da sua força de vontade — disse Júlia.
O professor parou no meio da classe e afirmou:
— Dos nossos sonhos. Sonhos não são desejos. Desejos evaporam no calor das dificuldades, sonhos resistem às altas temperaturas. Você tem sonhos, Cláudia? — perguntou o professor.
A resposta veio rápida e direta. Romanov foi novamente pego de surpresa.
— Minha mãe é doente, mas tem de trabalhar. Meu pai tem crise asmática, às vezes sente intensa falta de ar e, por isso, falta-lhe emprego, não tem trabalho fixo. Estou com 16 anos. Sou uma menina pobre, de origem pobre, que vive num ambiente pobre. Não está vendo os remendos de minha | saia? Faz um ano que não compro uma roupa nova — falou Cláudia desabafando.
Em seguida, uma gota de lágrima escapou de seus olhos. Comovida, ela acrescentou:
— Tenho medo de sonhar. Não sonho porque acho que ' meus sonhos se converterão em frustrações.
Romanov esfregou as mãos no rosto. Ficou com compaixão de sua aluna. Mas não podia sentir dó dela, pois o sentimento de dó não a estimularia a ter fé na vida e em sua capacidade de lutar. Então, olhou firmemente em seus olhos úmidos e repetiu as palavras que sempre falou para Pavlov antes de ele morrer no ataque terrorista em Beslan:
— Eu aposto que você vai brilhar, Cláudia, e se tornar um grande ser humano. Não tenha medo de se frustrar, tenha medo de não sonhar.
Em seguida, escreveu na lousa algumas frases e pediu para todos os alunos proclamá-las como se fossem sua bandeira, seu norte:
Os sonhos não determinam o lugar onde vocês vão chegar, mas produzem a força necessária para tirá-los do lugar em que vocês estão. Sonhem com as estrelas para que vocês possam pisar pelo menos na Lua. Sonhem com a Lua para que vocês possam pisar pelo menos nos altos montes. Sonhem com os altos montes para que vocês possam ter dignidade quando atravessarem os vales das perdas e das frustrações.
Os alunos ficaram abismados com esses pensamentos. Cláudia caiu num estado de reflexão. Como uma sedenta de anua, queria extrair dessas frases cada gota que delas emanava.
Percebendo seus alunos pensativos, o professor colocou mais lenha na fogueira das idéias. Para finalizar a aula, contou uma das histórias mais comoventes e encorajadoras que conhecia.
O câncer físico e o câncer emocional
Romanov disse que, certa vez, na Austrália havia uma jovem chamada Karen. Ela era sociável, bem-humorada, divertida, supervalorizava seus longos cabelos loiros e tinha um grande sonho, o de ser médica pediatra, mas era indisciplinada, não estudava para as provas, não lia livros, não tinha garra. Os amigos não davam nenhum crédito a ela quando dizia que ia ser pediatra.
A bela e alegre Karen vivia sua vida sem grandes tempestades, até que passou pelo mais dramático vendaval, pela mais angustiante experiência. Enquanto brincava e corria na praia num final de semana com seus amigos, sentiu tonturas e levou subitamente um tombo na areia.
Os amigos deram risadas pensando que ela tropeçara. Mas não tropeçou. Simplesmente teve vertigem, ficou tonta, perdeu o equilíbrio e caiu sem controle. Sua face se chocou com o solo fortemente e ficou impregnada de grãos de areia. Como demorava a se levantar, os amigos, abalados, a socorreram. Passado o susto, divertiram-se e Karen ainda curtiu a praia naquele dia.
Todavia, posteriormente, começou a ter alguns sintomas que preocuparam seus pais. Feitos alguns exames, diagnosticou-se que Karen infelizmente tinha um tumor cancerígeno. Como contar a ela? O que falar?
— Às vezes, dar certas notícias provoca um terrível nó na garganta, sufoca a emoção. Saber falar uma informação negativa! irrigando quem está ouvindo com esperança é uma arte e nem sempre se consegue. Karen precisava estar consciente da sua doença, pois tinha de se tratar, fazer cirurgia, mudar sua rotina; — disse o professor Romanov.
Quando os seus pais, junto com seus médicos, lhe! falaram a respeito da sua doença, o mundo desabou sobre ela. Não parava de chorar. Seu pai, em prantos, a abraçou. Sua mãe também a abraçou e lhe disse:
— Vamos vencer, juntos, o tumor! Tenha fé em Deus, tenha fé na vida, minha filha. Você é forte! — E a beijava sem parar.
Passado o desespero, ela sentiu-se mais consolada. No dia seguinte, seus pensamentos ficaram inquietos, perturbados, acelerados. Não parava de pensar no câncer. Tinha um namorado que, no começo, lhe deu força. Mas o medo de nunca mais beijar seus pais e de não abraçar seus amigos e namorado asfixiava seu ânimo.
Romanov comentou que Karen precisava lutar contra um inimigo que não via e que estava dentro dela. Passou por uma grande cirurgia e teve de mudar alguns dos seus hábitos por causa de um longo tratamento, incluindo radioterapia. Os seus cabelos longos e loiros enfraqueceram as raízes e começaram a cair.
Perdeu o ânimo de se vestir, de se cuidar. O sorriso já não era tão freqüente. Não apenas o medo da sua doença a rondava, mas passou a se sentir feia, diminuída e rejeitada. Faltava-lhe auto-estima, sobrava-lhe desânimo.
— Muitos de vocês têm saúde, mas não a valorizam, têm o mundo para explorar e conquistar, mas se sentem desanimados, sem coragem para lutar pelo que amam — ponderou o professor. A turma foi pega de surpresa com essa observação. Cláudia ficou pensativa.
Relatou que Karen colocava um chapéu na cabeça para disfarçar a queda de cabelo, mas todos sabiam que eles ralearam, afinal de contas eram grandes e vistosos. O namorado a abandonou, só aparecia de vez em quando. A menina extrovertida começou a se isolar e se deprimir. Perdeu o prazer de ir à escola. Colocava as mãos na cabeça e pensava: "Todos zombarão de mim". Construiu, sem perceber, alguns conflitos que a bloqueavam.
Suzan, uma grande amiga, foi visitá-la e percebeu seu indecifrável sofrimento. Com muito respeito, ela comunicou seu conflito aos colegas de classe. Eles ficaram profundamente sensibilizados pela amiga, Mas não sabiam o que fazer para que ela não se sentisse rejeitada, para que ela se animasse.
— Karen não podia se deprimir, pois uma pessoa deprimida cuida menos da sua qualidade de vida, diminui sua imunidade, enfraquece sua resistência para lutar contra o câncer. Ela havia emagrecido e apresentava vários episódios de vômito — disse Romanov.
Para desespero dos seus pais, parecia que ela não tinha garra de batalhar pela vida. Eles procuraram uma psicóloga para ajudá-la. Certo dia, andava muito abatida nos corredores do hospital em que se tratava. De repente, ouviu os gritos de alguns meninos
dentro de uma sala. Como sempre gostou de crianças, resolveu entrar. Ao entrar, levou um choque emocional.
Viu seis crianças brincando com bexigas. O que mais a abalou era que todas estavam com a cabeça brilhante, sem cabelos. Todas estavam em tratamento de câncer.
— Vem brincar com a gente — elas disseram. Ela se negou. Então, uma menina de seis anos, pegando em suas mãos, a levou para o centro da sala. Karen estava inibida, há meses não brincava. Todos a envolveram.
Ao ver o sorriso das crianças e a vontade de viver espelhada no rosto de cada uma delas, ela finalmente entrou na folia. Pulou, brincou, fez cócegas, parecia que o mundo tinha parado. Ao mesmo tempo que se divertia, começou a se lembrar do sonho de ser pediatra. Parecia que esse sonho estava sepultado, mas ele estava apenas escondido.
Nesse momento, o professor Romanov suspirou e fez uma pausa. A classe estava num profundo silêncio. Em seguida,! perguntou diretamente para Cláudia:
— Qual a diferença entre sonhos e desejos?
Ela pensou, mas não soube responder.
Posteriormente perguntou para toda a classe. Ninguém imaginou uma resposta. Momentos depois, comentou:
— Desejos não resistem ao calor das dificuldades, sonhos são projetos de vida, têm raízes, por isso resistem aos problemas, brotam mesmo depois de longa estiagem, pois suas raízes nutrem-se dos mananciais profundos da personalidade.
Cláudia ficou comovida com a resposta. Ansiosa, queria saber o desfecho da história. Romanov continuou.
Comentou que Karen tinha mais que um desejo, tinha um sonho, um projeto de vida. Ao se envolver com aquelas crianças, ela começou a resgatar seu sonho. Começou a freqüentar aquela sala, ter o contato com muitas crianças que, sem perceber, apostavam tudo na vida. Quanto mais a freqüentava mais se sentia fortalecida, Ela deu um salto na psicoterapia. As palavras de seus pais também começaram a germinar.
Certa vez, ela fez uma oração e a registrou na capa do seu mais bonito caderno:
— Deus, muitos não têm doenças físicas, vivem anos e anos, mas suas vidas não têm sonhos nem aventura. Dê-me força para lutar pela vida e pelos meus sonhos. Ensina-me a viver cada dia como se fosse eterno.
Karen fortaleceu-se tanto que, mesmo com a queda de cabelo se acentuando, resolveu voltar à escola. Comunicou seu desejo a Suzan. Fazia um mês que não
freqüentava as aulas. Antes de entrar na sala, lembrou-se dos tempos que brincava, mexia com os colegas e se divertia sem preocupações. De repente, ao entrar na sala, Karen levou um susto, ficou perplexa. Não conseguia acreditar na imagem que via.
Nesse momento, o professor Romanov fez outra pausa. Os alunos ficaram desesperados, queriam que ele continuasse a história. Mas ele queria fazê-los pensar.
— Sabe o que ela viu e a perturbou? — indagou Romanov.
Ninguém imaginou. Realmente era quase inimaginável.
— Viu a solidariedade! Viu a maioria dos seus amigos e das suas amigas calvos, entre elas Suzan — disse o professor. Em seguida, eles lhe disseram:
— Nós raspamos a cabeça para mostrar que estamos juntos com você nessa luta, para mostrar que nós amamos você do jeito que você está e que você é linda mesmo com sua queda de cabelo.
Foi um gesto de afetividade único. Karen caiu num doce e incontrolável pranto. Não conseguia dizer nenhuma palavra. Foi abraçada e beijada por todos os seus amigos. Estava atônita, flutuava diante da manifestação de carinho. Raramente o amor foi tão longe.
Na classe de Romanov, alguns alunos começaram a chorar, entre eles Cláudia.
— Os amigos de Karen aprenderam a se colocar no seu lugar, perceberam seus sentimentos ocultos e a apoiaram num momento tão difícil da sua vida. Aprender a colocar-se no lugar dos outros é uma das mais importantes características da inteligência, mas infelizmente a maioria dos jovens não a desenvolve. Essa característica é a melhor vacina contra as rejeições, discriminação e isolamento.
Em seguida, o professor ponderou que alguns casos de violência na escola, como alunos que saem atirando em seus! colegas de classe e professores, poderiam ser evitados. Como? Se aprendêssemos a perceber o sentimento das pessoas, compreender a linguagem do coração, decifrar o sofrimento que as palavras nunca disseram.
—E daí, professor? Karen venceu seu câncer? — perguntou Alex, ansioso para saber o final da história.
— Ela ainda teve vômitos, sentiu dores e se submeteu a outra cirurgia. Mas sua garra, coragem e fome de viver foram mais fortes. Dedicou-se com disciplina ao seu tratamento. Além disso, ela sei soltou, começou a participar de festas, a conviver sem medo comi as pessoas. Sua auto-estima melhorou, seu ânimo reacendeu. Por fim, Karen triunfou, venceu o câncer. Mas ela já era uma vencedora, pois já havia feito de cada dia um momento eterno.
A classe vibrou. Além disso, Karen foi disciplinada em outra coisa: na transformação do seu sonho em realidade. Ela, que não morria de amor pelos estudos, começou a se destacar, estudava não apenas para as provas, mas por causa do seu projeto de vida. Começou a ler livros, jornais, interpretar melhor os textos, debater idéias. Assim, passou a ter um ótimo desempenho na escola, A turma surpreendeu-se.
Por fim, entrou na faculdade de medicina. Após o término da faculdade, a dra. Karen se especializou em oncologia pediátrica, médica que cuida de câncer na infância. Brincava, sorria, parecia uma palhaça diante das crianças. Raramente se viu uma médica que amava tanto a vida e que batalhasse tanto pela vida de cada criança.
Inspirando seus alunos
Após contar essa história, o mestre da vida, Romanov, se aproximou de Cláudia e a surpreendeu. Admitiu que ela tinha razão ao observar que a ciência era, muitas vezes, seca e insensível. Os amigos de Karen perceberam a dor dela, mas ele não havia percebido o sentimento de sua aluna.
— Cláudia, falo de planetas que estão a milhões de quilômetros distantes de mim com tanta segurança, mas às vezes não sei reconhecer os sentimentos dos meus alunos que estão tão próximos. Não percebi seu sofrimento. Desculpe-me. — Em seguida, aproximou-se dela e a abraçou.
Cláudia, que estava comovida com a história, ficou boquiaberta com seu mestre. Jamais viu um professor pedir desculpa para um aluno. Antes de bater o sinal para terminar a aula, Romanov fez o desfecho:
— Além do câncer físico, há o câncer psíquico. Lutem contra o câncer do preconceito, do medo, da falta de sonhos e da falta de garra para transformar seus projetos de vida em realidade. Os nossos maiores inimigos estão dentro de nós.
Sob um clima de intensa inspiração, o professor Romanov escreveu na lousa em letras enormes:
Bons jovens têm sonhos ou disciplina. Jovens brilhantes têm sonhos e disciplina. Pois sonhos sem disciplina produzem pessoas frustradas, que nunca transformam seus sonhos em realidade, e disciplina sem sonhos produz servos, pessoas que executam ordens, que fazem tudo automaticamente e sem pensar.
Virando o jogo
Nesse momento, Cláudia percebeu que foi injusta com seus pais. Sua mãe, apoiada pelo pai, a incentivava a estudar para que pudesse construir um destino diferente do deles. Cláudia tinha disciplina, mas não tinha sonhos, Não estava vivendo as palavras de Alexandre Graham Bell: "Se andarmos apenas por caminhos já traçados, chegaremos apenas onde os outros chegaram".
Os pais eram pobres e doentes, mas eram sábios. Só que ela não enxergava a sabedoria deles. Após ouvir a história e ver as reações de Romanov, saltaram à memória frases que seus pais sempre lhe diziam, mas que só agora pôde valorizar intensamente. Pedindo permissão, levantou-se e foi escrevê-las na lousa:
Um ladrão rouba um tesouro, mas não furta a inteligência. Uma crise destrói uma herança, mas não uma profissão. Não importa se você não tem dinheiro, você é uma pessoa rica, pois possui o maior de todos os capitais: a sua inteligência. Invista nela. Estude!
Os alunos, depois de abraçar afetuosamente Cláudia, anotaram essa frase e a do professor Romanov. Fizeram delas um par de asas para voar alto. Cláudia sonhou em ser bióloga e trabalhar com células-tronco. Desejou aventurar-se pelo mundo da genética, pois aprendeu a se aventurar pelo mundo dos sonhos...
Bons filhos têm sonhos ou
disciplina, filhos brilhantes
têm sonhos e disciplina.
O mais complexo dos planetas:
a mente humana
O professor Romanov dava excelentes aulas de física. Certa vez, levou os alunos a compreender as poderosas forças do universo. Revelou a impressionante força gravitacional entre os planetas e as estrelas. Comentou que muitas estrelas já foram destruídas e que a luz que víamos delas eram apenas os traços do seu passado. Disse ainda que no centro das galáxias existiam os fantásticos buracos negros, cuja força gravitacional era tão grande que sugava e destruía planetas e estrelas inteiros.
— Não duraríamos um milésimo de segundo se estivéssemos na proximidade desses buracos negros — comentou o professor para um extremamente atento grupo de alunos.
Falou que em muitos sistemas as estrelas e planetas se chocavam. Os alunos se arrepiaram, pois não sabiam disso. Pensaram na catástrofe se a Terra se chocasse com o Sol. Apenas a aproximação do Sol inviabilizaria a vida na Terra, imaginaram.
— Sabe quantas galáxias existem no universo? — perguntou Romanov. A maioria dos alunos não tinha a menor idéia.
— Um milhão — arriscou Leonardo, mas achava que estava exagerando.
— Muito mais — disse o professor. — Na realidade, hoje se sabe que há mais de cem bilhões de galáxias e a cada ano descobre-se um número maior. Moramos na Via Láctea, que é uma das inumeráveis galáxias do universo.
— E sabem quantos planetas e estrelas existem em cada galáxia? — novamente indagou o professor.
— Mais de cem — disse Júlia. Ela pensou que talvez houvesse apenas alguns sistemas solares dentro de cada galáxia.
— Mais de mil — respondeu Pedro.
— Erraram de novo. Em cada galáxia há milhões de planetas e estrelas. E imaginem que a Terra é apenas um desses planetas e o Sol é apenas uma dessas estrelas.
Os alunos ficaram perplexos. Nunca refletiram que o universo fosse tão grande. Todos faziam uma viagem espacial fantástica. Todos estavam vibrando, exceto uma aluna: Cláudia. Sua cabeça estava baixa, seu semblante entristecido. Cláudia parecia estar em outro planeta. E estava. Estava no mais complexo dos planetas, no planeta da sua mente, viajando nas suas idéias perturbadoras. Ultimamente ela estava ansiosa, sem concentração e roia as suas unhas.
Percebendo-a cabisbaixa, Romanov delicadamente perguntou:
— Querida Cláudia, o que está acontecendo? Você parece tão distante.
Cláudia levantou sua cabeça lentamente. Fez um momento solene de silêncio. Em seguida, como já havia aprendido um pouco com Romanov a não ter medo de falar o que pensa, respondeu:
— De que adianta conhecer as forças do universo se não tenho força para resolver meus problemas pessoais?
Romanov ficou chocado com seu raciocínio inteligente e realista. Em seguida, como se quisesse pôr para fora aquilo que a sufocava, Cláudia acrescentou:
— De que adianta conhecer outros planetas se nesse planeta há tantas misérias sem solução? O que me motiva a discutir sobre as imensas galáxias que estão a milhões de anos-luz, se o pequeno espaço da minha casa é um mundo opaco, se vejo meu pai triste, sem emprego fixo, sem condições de sobreviver e, pior ainda, sem esperança?
Os alunos ficaram abalados com sua resposta. O professor de física engoliu a seco as palavras de Cláudia. Ele pensou: "Ela tem razão. Por um lado, conhecer o
universo era importante para as pesquisas científicas, mas, por outro lado, muitas vezes a ciência está longe da realidade das pessoas, do mundo real e concreto dos seus alunos".
Romanov sabia que a ciência estava gerando gigantes na informação mas meninos na maturidade emocional, na formação como seres humanos. O sistema educacional do qual ele fazia parte estava seco, frio, distante, desumanizado.
Não poucos alunos da Escola dos Pesadelos eram financeiramente pobres. Alguns pais estavam desempregados ou subempregados, outros ganhavam tão pouco que mal conseguiam ganhar para sustentar sua família. Algumas mães deixavam de se alimentar para que seus filhos comessem um pouco melhor. Alguns pais não dormiam pensando no futuro dos seus filhos.
As dificuldades dos pais eram tão grandes que muitos alunos não tinham esperança de ter sucesso profissional. Pensavam que repetiriam a história deles, seriam humilhados, atravessariam crises financeiras, teriam pouco conforto. Como Cláudia, pensavam: "Se meus pais não tiveram oportunidade! para ter melhor qualidade de vida, dificilmente as teremos".
A esperança dos jovens era o estudo. Entretanto, os alunos saíam com um diploma nas mãos, mas a grande maioria não mudava suas histórias. Devido às aulas serem frias e distante» da realidade dos alunos, eles não desenvolviam espírito! empreendedor, ousadia, sonhos, capacidade crítica de pensar, habilidade para superar frustrações.
Mesmo nas escolas cujos pais eram ricos, os alunos saíam despreparados para os desafios da vida. Eles passavam nas provas curriculares, mas não nas provas sociais. Não sabiam! enfrentar seus problemas. Cresciam na sombra dos seus pais,] não eram autores da sua história. Muitos se tornavam torradores de herança. Eram poucos os que escapavam do velho ciclo da riqueza: avô rico, filho nobre, neto pobre. Muitos filhos de nobres conheciam o sabor da escassez e da miséria.
Romanov, por um lado, estava abalado com o pessimismo e realismo de Cláudia, por outro lado, estava feliz pela sua coragem de criticá-lo, de questionar sua postura em sala de aula. Os alunos estavam aprendendo a debater idéias, questionar seus mestres, criticar o conhecimento e sua utilidade. A Escola dos Pesadelos estava se tornando um canteiro para cultivar a inteligência e não um depósito de informações.
Levando os alunos a usar a força interior
O pensamento de Cláudia levou o professor a se interiorizar e mudar os rumos da aula. Começou a aplicar a física na vida diária. Comentou que há trilhões de planetas e moramos em um deles.
— É importante conquistar o espaço, mas não sabemos cuidar do nosso pequeno espaço, do nosso intrigante planeta. Anualmente novos rios eram poluídos, espécies são extintas e a temperatura global aumenta.
O instigante professor queria entrar no drama de Cláudia, mas ainda não era o momento. Fez algumas órbitas em outros assuntos, e acrescentou:
— Pensem um pouco. Apesar de sermos tão pequenos nesse imensurável universo, somos tão orgulhosos, estúpidos c agressivos, a ponto de nos acharmos donos do mundo. Na realidade, não somos donos de nada, nem da verdade, nem da nossa própria vida. Desenvolvemos tecnologias para nos comunicar com o mundo, para produzir veículos e construir edifícios, mas não desenvolvemos tecnologia para dialogar, para ser tranqüilos, alegres, felizes. Usamos a força para fazer guerras físicas ou guerras comerciais, mas não usamos a nossa força para dominar nossa ansiedade, intolerância, desespero, desesperança.
Os alunos começaram a desenvolver inteligência crítica sobre esses sérios assuntos. O professor admitiu publicamente que Cláudia tinha razão e acrescentou:
— Nós nos preocupamos tanto em informar que esquecemos de formar. O conhecimento está aqui para servi-los e não para que vocês sirvam o conhecimento. Mas, invertemos os valores. — E a estimulou perguntando: — De onde provém a maior força de um ser humano?
Cláudia pensou, pensou, mas não soube responder.
Depois, perguntou para a classe.
— Dos seus músculos — Helena respondeu.
— Da sua força de vontade — disse Júlia.
O professor parou no meio da classe e afirmou:
— Dos nossos sonhos. Sonhos não são desejos. Desejos evaporam no calor das dificuldades, sonhos resistem às altas temperaturas. Você tem sonhos, Cláudia? — perguntou o professor.
A resposta veio rápida e direta. Romanov foi novamente pego de surpresa.
— Minha mãe é doente, mas tem de trabalhar. Meu pai tem crise asmática, às vezes sente intensa falta de ar e, por isso, falta-lhe emprego, não tem trabalho fixo. Estou com 16 anos. Sou uma menina pobre, de origem pobre, que vive num ambiente pobre. Não está vendo os remendos de minha | saia? Faz um ano que não compro uma roupa nova — falou Cláudia desabafando.
Em seguida, uma gota de lágrima escapou de seus olhos. Comovida, ela acrescentou:
— Tenho medo de sonhar. Não sonho porque acho que ' meus sonhos se converterão em frustrações.
Romanov esfregou as mãos no rosto. Ficou com compaixão de sua aluna. Mas não podia sentir dó dela, pois o sentimento de dó não a estimularia a ter fé na vida e em sua capacidade de lutar. Então, olhou firmemente em seus olhos úmidos e repetiu as palavras que sempre falou para Pavlov antes de ele morrer no ataque terrorista em Beslan:
— Eu aposto que você vai brilhar, Cláudia, e se tornar um grande ser humano. Não tenha medo de se frustrar, tenha medo de não sonhar.
Em seguida, escreveu na lousa algumas frases e pediu para todos os alunos proclamá-las como se fossem sua bandeira, seu norte:
Os sonhos não determinam o lugar onde vocês vão chegar, mas produzem a força necessária para tirá-los do lugar em que vocês estão. Sonhem com as estrelas para que vocês possam pisar pelo menos na Lua. Sonhem com a Lua para que vocês possam pisar pelo menos nos altos montes. Sonhem com os altos montes para que vocês possam ter dignidade quando atravessarem os vales das perdas e das frustrações.
Os alunos ficaram abismados com esses pensamentos. Cláudia caiu num estado de reflexão. Como uma sedenta de anua, queria extrair dessas frases cada gota que delas emanava.
Percebendo seus alunos pensativos, o professor colocou mais lenha na fogueira das idéias. Para finalizar a aula, contou uma das histórias mais comoventes e encorajadoras que conhecia.
O câncer físico e o câncer emocional
Romanov disse que, certa vez, na Austrália havia uma jovem chamada Karen. Ela era sociável, bem-humorada, divertida, supervalorizava seus longos cabelos loiros e tinha um grande sonho, o de ser médica pediatra, mas era indisciplinada, não estudava para as provas, não lia livros, não tinha garra. Os amigos não davam nenhum crédito a ela quando dizia que ia ser pediatra.
A bela e alegre Karen vivia sua vida sem grandes tempestades, até que passou pelo mais dramático vendaval, pela mais angustiante experiência. Enquanto brincava e corria na praia num final de semana com seus amigos, sentiu tonturas e levou subitamente um tombo na areia.
Os amigos deram risadas pensando que ela tropeçara. Mas não tropeçou. Simplesmente teve vertigem, ficou tonta, perdeu o equilíbrio e caiu sem controle. Sua face se chocou com o solo fortemente e ficou impregnada de grãos de areia. Como demorava a se levantar, os amigos, abalados, a socorreram. Passado o susto, divertiram-se e Karen ainda curtiu a praia naquele dia.
Todavia, posteriormente, começou a ter alguns sintomas que preocuparam seus pais. Feitos alguns exames, diagnosticou-se que Karen infelizmente tinha um tumor cancerígeno. Como contar a ela? O que falar?
— Às vezes, dar certas notícias provoca um terrível nó na garganta, sufoca a emoção. Saber falar uma informação negativa! irrigando quem está ouvindo com esperança é uma arte e nem sempre se consegue. Karen precisava estar consciente da sua doença, pois tinha de se tratar, fazer cirurgia, mudar sua rotina; — disse o professor Romanov.
Quando os seus pais, junto com seus médicos, lhe! falaram a respeito da sua doença, o mundo desabou sobre ela. Não parava de chorar. Seu pai, em prantos, a abraçou. Sua mãe também a abraçou e lhe disse:
— Vamos vencer, juntos, o tumor! Tenha fé em Deus, tenha fé na vida, minha filha. Você é forte! — E a beijava sem parar.
Passado o desespero, ela sentiu-se mais consolada. No dia seguinte, seus pensamentos ficaram inquietos, perturbados, acelerados. Não parava de pensar no câncer. Tinha um namorado que, no começo, lhe deu força. Mas o medo de nunca mais beijar seus pais e de não abraçar seus amigos e namorado asfixiava seu ânimo.
Romanov comentou que Karen precisava lutar contra um inimigo que não via e que estava dentro dela. Passou por uma grande cirurgia e teve de mudar alguns dos seus hábitos por causa de um longo tratamento, incluindo radioterapia. Os seus cabelos longos e loiros enfraqueceram as raízes e começaram a cair.
Perdeu o ânimo de se vestir, de se cuidar. O sorriso já não era tão freqüente. Não apenas o medo da sua doença a rondava, mas passou a se sentir feia, diminuída e rejeitada. Faltava-lhe auto-estima, sobrava-lhe desânimo.
— Muitos de vocês têm saúde, mas não a valorizam, têm o mundo para explorar e conquistar, mas se sentem desanimados, sem coragem para lutar pelo que amam — ponderou o professor. A turma foi pega de surpresa com essa observação. Cláudia ficou pensativa.
Relatou que Karen colocava um chapéu na cabeça para disfarçar a queda de cabelo, mas todos sabiam que eles ralearam, afinal de contas eram grandes e vistosos. O namorado a abandonou, só aparecia de vez em quando. A menina extrovertida começou a se isolar e se deprimir. Perdeu o prazer de ir à escola. Colocava as mãos na cabeça e pensava: "Todos zombarão de mim". Construiu, sem perceber, alguns conflitos que a bloqueavam.
Suzan, uma grande amiga, foi visitá-la e percebeu seu indecifrável sofrimento. Com muito respeito, ela comunicou seu conflito aos colegas de classe. Eles ficaram profundamente sensibilizados pela amiga, Mas não sabiam o que fazer para que ela não se sentisse rejeitada, para que ela se animasse.
— Karen não podia se deprimir, pois uma pessoa deprimida cuida menos da sua qualidade de vida, diminui sua imunidade, enfraquece sua resistência para lutar contra o câncer. Ela havia emagrecido e apresentava vários episódios de vômito — disse Romanov.
Para desespero dos seus pais, parecia que ela não tinha garra de batalhar pela vida. Eles procuraram uma psicóloga para ajudá-la. Certo dia, andava muito abatida nos corredores do hospital em que se tratava. De repente, ouviu os gritos de alguns meninos
dentro de uma sala. Como sempre gostou de crianças, resolveu entrar. Ao entrar, levou um choque emocional.
Viu seis crianças brincando com bexigas. O que mais a abalou era que todas estavam com a cabeça brilhante, sem cabelos. Todas estavam em tratamento de câncer.
— Vem brincar com a gente — elas disseram. Ela se negou. Então, uma menina de seis anos, pegando em suas mãos, a levou para o centro da sala. Karen estava inibida, há meses não brincava. Todos a envolveram.
Ao ver o sorriso das crianças e a vontade de viver espelhada no rosto de cada uma delas, ela finalmente entrou na folia. Pulou, brincou, fez cócegas, parecia que o mundo tinha parado. Ao mesmo tempo que se divertia, começou a se lembrar do sonho de ser pediatra. Parecia que esse sonho estava sepultado, mas ele estava apenas escondido.
Nesse momento, o professor Romanov suspirou e fez uma pausa. A classe estava num profundo silêncio. Em seguida,! perguntou diretamente para Cláudia:
— Qual a diferença entre sonhos e desejos?
Ela pensou, mas não soube responder.
Posteriormente perguntou para toda a classe. Ninguém imaginou uma resposta. Momentos depois, comentou:
— Desejos não resistem ao calor das dificuldades, sonhos são projetos de vida, têm raízes, por isso resistem aos problemas, brotam mesmo depois de longa estiagem, pois suas raízes nutrem-se dos mananciais profundos da personalidade.
Cláudia ficou comovida com a resposta. Ansiosa, queria saber o desfecho da história. Romanov continuou.
Comentou que Karen tinha mais que um desejo, tinha um sonho, um projeto de vida. Ao se envolver com aquelas crianças, ela começou a resgatar seu sonho. Começou a freqüentar aquela sala, ter o contato com muitas crianças que, sem perceber, apostavam tudo na vida. Quanto mais a freqüentava mais se sentia fortalecida, Ela deu um salto na psicoterapia. As palavras de seus pais também começaram a germinar.
Certa vez, ela fez uma oração e a registrou na capa do seu mais bonito caderno:
— Deus, muitos não têm doenças físicas, vivem anos e anos, mas suas vidas não têm sonhos nem aventura. Dê-me força para lutar pela vida e pelos meus sonhos. Ensina-me a viver cada dia como se fosse eterno.
Karen fortaleceu-se tanto que, mesmo com a queda de cabelo se acentuando, resolveu voltar à escola. Comunicou seu desejo a Suzan. Fazia um mês que não
freqüentava as aulas. Antes de entrar na sala, lembrou-se dos tempos que brincava, mexia com os colegas e se divertia sem preocupações. De repente, ao entrar na sala, Karen levou um susto, ficou perplexa. Não conseguia acreditar na imagem que via.
Nesse momento, o professor Romanov fez outra pausa. Os alunos ficaram desesperados, queriam que ele continuasse a história. Mas ele queria fazê-los pensar.
— Sabe o que ela viu e a perturbou? — indagou Romanov.
Ninguém imaginou. Realmente era quase inimaginável.
— Viu a solidariedade! Viu a maioria dos seus amigos e das suas amigas calvos, entre elas Suzan — disse o professor. Em seguida, eles lhe disseram:
— Nós raspamos a cabeça para mostrar que estamos juntos com você nessa luta, para mostrar que nós amamos você do jeito que você está e que você é linda mesmo com sua queda de cabelo.
Foi um gesto de afetividade único. Karen caiu num doce e incontrolável pranto. Não conseguia dizer nenhuma palavra. Foi abraçada e beijada por todos os seus amigos. Estava atônita, flutuava diante da manifestação de carinho. Raramente o amor foi tão longe.
Na classe de Romanov, alguns alunos começaram a chorar, entre eles Cláudia.
— Os amigos de Karen aprenderam a se colocar no seu lugar, perceberam seus sentimentos ocultos e a apoiaram num momento tão difícil da sua vida. Aprender a colocar-se no lugar dos outros é uma das mais importantes características da inteligência, mas infelizmente a maioria dos jovens não a desenvolve. Essa característica é a melhor vacina contra as rejeições, discriminação e isolamento.
Em seguida, o professor ponderou que alguns casos de violência na escola, como alunos que saem atirando em seus! colegas de classe e professores, poderiam ser evitados. Como? Se aprendêssemos a perceber o sentimento das pessoas, compreender a linguagem do coração, decifrar o sofrimento que as palavras nunca disseram.
—E daí, professor? Karen venceu seu câncer? — perguntou Alex, ansioso para saber o final da história.
— Ela ainda teve vômitos, sentiu dores e se submeteu a outra cirurgia. Mas sua garra, coragem e fome de viver foram mais fortes. Dedicou-se com disciplina ao seu tratamento. Além disso, ela sei soltou, começou a participar de festas, a conviver sem medo comi as pessoas. Sua auto-estima melhorou, seu ânimo reacendeu. Por fim, Karen triunfou, venceu o câncer. Mas ela já era uma vencedora, pois já havia feito de cada dia um momento eterno.
A classe vibrou. Além disso, Karen foi disciplinada em outra coisa: na transformação do seu sonho em realidade. Ela, que não morria de amor pelos estudos, começou a se destacar, estudava não apenas para as provas, mas por causa do seu projeto de vida. Começou a ler livros, jornais, interpretar melhor os textos, debater idéias. Assim, passou a ter um ótimo desempenho na escola, A turma surpreendeu-se.
Por fim, entrou na faculdade de medicina. Após o término da faculdade, a dra. Karen se especializou em oncologia pediátrica, médica que cuida de câncer na infância. Brincava, sorria, parecia uma palhaça diante das crianças. Raramente se viu uma médica que amava tanto a vida e que batalhasse tanto pela vida de cada criança.
Inspirando seus alunos
Após contar essa história, o mestre da vida, Romanov, se aproximou de Cláudia e a surpreendeu. Admitiu que ela tinha razão ao observar que a ciência era, muitas vezes, seca e insensível. Os amigos de Karen perceberam a dor dela, mas ele não havia percebido o sentimento de sua aluna.
— Cláudia, falo de planetas que estão a milhões de quilômetros distantes de mim com tanta segurança, mas às vezes não sei reconhecer os sentimentos dos meus alunos que estão tão próximos. Não percebi seu sofrimento. Desculpe-me. — Em seguida, aproximou-se dela e a abraçou.
Cláudia, que estava comovida com a história, ficou boquiaberta com seu mestre. Jamais viu um professor pedir desculpa para um aluno. Antes de bater o sinal para terminar a aula, Romanov fez o desfecho:
— Além do câncer físico, há o câncer psíquico. Lutem contra o câncer do preconceito, do medo, da falta de sonhos e da falta de garra para transformar seus projetos de vida em realidade. Os nossos maiores inimigos estão dentro de nós.
Sob um clima de intensa inspiração, o professor Romanov escreveu na lousa em letras enormes:
Bons jovens têm sonhos ou disciplina. Jovens brilhantes têm sonhos e disciplina. Pois sonhos sem disciplina produzem pessoas frustradas, que nunca transformam seus sonhos em realidade, e disciplina sem sonhos produz servos, pessoas que executam ordens, que fazem tudo automaticamente e sem pensar.
Virando o jogo
Nesse momento, Cláudia percebeu que foi injusta com seus pais. Sua mãe, apoiada pelo pai, a incentivava a estudar para que pudesse construir um destino diferente do deles. Cláudia tinha disciplina, mas não tinha sonhos, Não estava vivendo as palavras de Alexandre Graham Bell: "Se andarmos apenas por caminhos já traçados, chegaremos apenas onde os outros chegaram".
Os pais eram pobres e doentes, mas eram sábios. Só que ela não enxergava a sabedoria deles. Após ouvir a história e ver as reações de Romanov, saltaram à memória frases que seus pais sempre lhe diziam, mas que só agora pôde valorizar intensamente. Pedindo permissão, levantou-se e foi escrevê-las na lousa:
Um ladrão rouba um tesouro, mas não furta a inteligência. Uma crise destrói uma herança, mas não uma profissão. Não importa se você não tem dinheiro, você é uma pessoa rica, pois possui o maior de todos os capitais: a sua inteligência. Invista nela. Estude!
Os alunos, depois de abraçar afetuosamente Cláudia, anotaram essa frase e a do professor Romanov. Fizeram delas um par de asas para voar alto. Cláudia sonhou em ser bióloga e trabalhar com células-tronco. Desejou aventurar-se pelo mundo da genética, pois aprendeu a se aventurar pelo mundo dos sonhos...
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